quinta-feira, 30 de março de 2023
Stonehenge Alemão - A sinistra história de morte e sacrifício no Círculo de Pömmelte
terça-feira, 28 de março de 2023
"Pactos" - Resenha da Antologia da Editora Darkside sobre barganhas diabólicas
O diabo sempre foi uma figura central no imaginário da humanidade.
Toda cultura, toda sociedade possui o seu equivalente. Uma figura de maldade lendária, dedicado a explorar as mazelas da humanidade e obter para si o qie existe de mais valioso: a alma dos mortais.
O diabo é sempre retratado como esperto, astuto e perspicaz. Uma figura que usa suas habilidades para encantar e convencer as pessoas de que suas intenções são as melhores e que um empurraozinho seu resolve a maioria dos problemas.
Desde que o mundo é mundo, e que o diabo é o diabo, a figura do demônio esta associada aos pactos. A barganha diabólica sempre fez parte da mitologia que cerca essa figura sinistra. O modus operandi é sempre o mesmo: um indivíduo desesperado, necessitado ou curioso contata o diabo e ouve sua proposta tentadora. Decide então aceitar ou não, já que livre arbítrio é parte essencial da coisa.
Como bom negociador que é, o diabo parece ter uma habilidade notável de saber o que a pessoa mais deseja, o que aquece seu coração e atrai seu olhar. Ele é insidioso, sinaliza com aquilo que está fora do alcance e oferta o quase impossível.
Mas tudo tem seu preço!
Ele sempre quer algo em troca de sua ajuda. Submissão, devoção, serviço, ou mais frequentemente, a alma da pessoa. É essa a moeda de troca no câmbio infernal: alma que sobe fora de seu alcance, alma que desce direto para suas garras. Nada é mais valioso para o "coisa ruim" do que a alma de alguém puro que a oferece de bom grado, mas, verdade seja dita, ele aceita qualquer um.
Tão popular quanto a história do diabo que oferece a negociação, são as histórias de indivíduos que aceitam a proposta e tentam vence-lo em seu próprio jogo. "Ser mais esperto que o diabo" e derrotá-lo em seus termos é para poucos. Enrolar, ludibriar, passar o grande negociante para trás, parece ser a meta de um sem número de indivíduos e claro, personagens da literatura.
A origem disso pode ser simplesmente contar uma boa história, provar que o diabo não é infalível ou ainda, mostrar que sempre há esperança para aqueles que se arrependem. O pacto não é definitivo e, mediante a esperteza do signatário, é possível desfazer o mais intrincado contrato. Ou ao menos, é no que apostam vários autores.
Pois bem... "Pactos", da Editora Darkside oferece ao leitor seis contos onde a barganha com o Diabo é a premissa básica. São histórias curiosas: algumas em tom de anedota, mais leves e divertidas, outras mais sérias e arrepiantes. Todas elas, no entanto, se debruçam sobre as implicações de desejar algo além do alcance e do que se está disposto a abrir mão para conseguir.
Alguns dos contos contém críticas sociais contundentes e fazem uma observação mordaz da hipocrisia e da falsa moralidade, sobretudo das instituições. São boas histórias, cada uma ao seu modo contribuindo para o tema sugerido.
A seleção conta com nomes consagrados da literatura como Nathaniel Hawthorne, Mark Twain, Edgar Allan Poe e Washington Irving que oferecem sua interpretação da célebre negociação com a temida chancela diabólica. Como ocorre em toda antologia, há contos bons e outros nem tanto, mas é inegável a qualidade deles, ainda que alguns possam ser um pouco maçantes.
O primeiro é "O Jovem Goodman Brown", de Hawthorne, uma fábula moral se passando na velha e pecaminosa cidadezinha de Salem, palco da famosa Caça às Bruxas nos tempos coloniais. Aqui temos um jovem ponderando sobre vender ou não sua alma, enquanto descobre que outros individuos, supostamente mais virtuosos do vilarejo, já o fizeram.
"O Diabo e Daniel Webster" do poeta Stephen Bennet é o segundo conto. Ele narra a tentativa de um sujeito que firmou um pacto diabólico de desvencilhar-se do contrato. Para isso ele contrata um advogado para defende-lo e este pede a formação de um tribunal do juri (composto por vilões e criminosos famosos) para deliberar sobre o veredito.
Mark Twain, um dos pais fundadores da literatura norte-americana nos oferece "Vendida para Satã", um conto curto no qual o diabo e um investidor discutem sobre as implicações da barganha e da verdadeira riqueza.
Cabe ao lendário Edgar Allan Poe contribuir com uma peça satírica menor intitulada "O Diabo no Campanário", enquanto Harriet B. Stone traz "Como Vencer o Diabo", as duas histórias tem seus méritos, mas ao meu ver são as mais fracas da antologia.
Já "O Diabo e Tom Walker" de Washington Irving é bem mais interessante e instigante em sua proposta de analisar a cobiça e avareza humanas e suas consequências.
Além dos contos, o livro se esmera no quesito de extras com uma belíssima introdução de Márcia Heloísa que organizou e traduziu os contos selecionados. O Posfácio de Pedro Pone também é inspirador. O volume conclui com referências cinematográficas de filmes e seriados que exploram o tema com fotos de produção e cartazes. O conteúdo é bonito e as referências válidas, embora o espaço pudesse ser melhor aproveitado com outros contos.
Visualmente, "Pactos" é sensacional, uma produção de qualidade e beleza incríveis como se tornou padrão nas publicações da Editora Darkside. A capa remetendo aos clássicos livros de magia negra, com tratamento fosco envelhecido se sobressai na prateleira e convida a folhear as páginas de borda escura. O bode e a cabra negra, animais ligados à mitologia diabólica estão em toda parte: na capa, na arte interna e mesmo nas fotos dos autores que são sempre escoltados por tais animais. O resultado é sinistro e casa bem com o tema.
Em um acervo de livros incrivelmente bem produzidos, ouso dizer que "Pactos" talvez seja um dos trabalhos mais bonitos da Darkside. Um deleite para os colecionadores que apreciam um material de qualidade gráfica irretocável.
O livro pode ser encontrado na página oficial da Darkside, onde pode ser adquirido com alguns mimos - no caso cartões postais, ou achado em lojas virtuais e livrarias.
Uma boa pedida!
sexta-feira, 24 de março de 2023
O Voo das Strzyga - Feiticeiras aladas do folclore eslavo
terça-feira, 21 de março de 2023
Todas as Faces do Terror - Os Doze Subgêneros do Horror (Parte 3)
sexta-feira, 17 de março de 2023
Dia de St. Patrick - A Ilha Esmeralda, Serpentes e o Mythos
Esse artigo está sendo REEDITADO e já foi publicado anteriormente aqui no Mundo Tentacular. Mas como é Dia de St. Patrick não custa nada lembrar dele.
Hoje 17 de março, é dia de São Patrício (ou St. Patrick)!
Há muitas lendas à respeito desse Santo da Igreja Católica, conhecido por ser o Padroeiro da Irlanda.
O pouco que se sabe à respeito da vida e trabalho de São Patrício vem de suas próprias escrituras em latim. Na coleção de manuscritos chamada Confissões, Patrick afirma ter nascido na Britânia dominada pelos romanos, o filho de Calpurnius, um diácono no vilarejo de Bannaven. Patrick teria sido capturado após um ataque de saqueadores irlandeses aos 16 anos, levado para a Irlanda, foi vendido como escravo. Ele serviu como pastor de ovelhas nas montanhas de Slemish, a serviço do chefe guerreiro Milchu. Nessa época, seus seguidores contam que ele já era capaz de falar com Deus e operar pequenos milagres.
Depois de seis anos de cativeiro, Patrick escapou e retornou para sua casa onde expressou o desejo de seguir carreira religiosa. Não se sabe ao certo onde ele recebeu sua educação, mas acredita-se que ele tenha abraçado o sacerdócio sob a tutela de St. Germanus de Auxerre.
De acordo com a crônica de Patrick, ele teve uma visão divina que o instruiu a retornar para a Irlanda a fim de converter os povos que lá viviam. Nesse ponto lenda e história se fundem para criar uma personagem capaz de realizar milagres grandiosos e de praticamente sozinho converter todo um povo ao catolicismo, crença que se mantém até os dias de hoje.
Bom, nesse momento você deve estar pensando: "Tudo bem, legal, mas o que isso tem a ver com o tema desse Blog?".
Muito justo perguntar. Há uma história interessante à respeito de St. Patrick.
Entre as grandes realizações do padroeiro da Irlanda consta um feito que ficou conhecido como "A Expulsão das Serpentes da Irlanda". E a coisa é tão marcante que as imagens de St. Patrick em geral vem acompanhadas de serpentes aos seus pés.
Segundo a tradição, certo dia Patrick, foi convocado para ir até um vilarejo a fim de confortar uma família que havia perdido a filha, vítima da picada de uma serpente venenosa. Compadecido pela tragédia, Patrick decidiu que a Irlanda se veria livre desses animais peçonhentos. Ele teria então realizado um grande milagre que fez com que todas as serpentes deixassem a Ilha. A lenda diz que St. Patrick encantou as serpentes com sua voz e cantando hinos religiosos marchou decidido até a costa seguido por um tapete vivo, composto de milhares de répteis venenosos. Ao chegar ao litoral, comandou as serpentes a entrar no mar, livrando assim a Ilha Esmeralda de sua presença.
É uma bela história e por muitos séculos ela foi tida como verdade, reforçada pelo fato de realmente não haver ofídios na Irlanda.
Em verdade, St. Patrick não expulsou as serpentes da Irlanda -- répteis não se adaptam ao clima frio, e o severo inverno irlandês sempre os afugentou. Na realidade, quando a lenda diz que St. Patrick expulsou as "serpentes" da Irlanda, estas são uma metáfora aos cultos que existiam lá até então.
Os povos que originalmente habitavam a Irlanda possuíam raízes pagãs. St Patrick converteu tribos e clãs inteiros, sem derramamento de sangue ou revoltas. Conforme os registros históricos, crenças muito antigas foram sistematicamente abandonadas e houve conversões em massa. Em pouco menos de 30 anos, a Irlanda se rendeu incondicionalmente ao Catolicismo, um feito impressionante.
Ainda assim, o que isso tem a ver com o Mythos?
Pois bem, faz alguns anos li uma matéria à respeito de mitos irlandeses e é incrível como certas coisas se encaixavam perfeitamente na mitologia lovecraftiana. Não apenas os Fomorian (diabos do mar) e a lenda de Balor olho maligno, há mais no folclore irlandês que clama para ser reconhecido como puro Lovecraft.
Nesse contexto, que tal supor que St. Patrick realmente expulsou as serpentes da Irlanda e que além disso foi o responsável por banir os cultos pagãos existentes. Sob uma ótica do Mythos é possível juntar essas informações em uma mesma conclusão:
St. Patrick teria expulsado o Culto do Povo Serpente na Irlanda.
Uma das coisas que eu realmente gosto é de interpretar fatos históricos e lendas sob um ponto de vista do Mythos. Se essas criaturas existissem como elas teriam influenciado acontecimentos históricos?
Podemos inferir que o Povo Serpente -- uma antiquíssima raça humanóide de homens com cabeça de serpente provenientes de eras antidiluvianas -- estava presente na Irlanda do século IV. De fato, as estórias mais clássicas sobre essas criaturas situam suas bases, nas Ilhas Britânicas (sobretudo Gales e Escócia), e não seria de todo impossível que eles habitassem também a Irlanda.
Talvez as lendas sobre serpentes afligindo o bom povo da Irlanda, se referissem não a répteis de verdade ou cultos pagãos, mas a coisas muito piores. O povo serpente é capaz de se misturar a população, assumindo a forma humana, dessa forma poderiam impor suas crenças nefastas e dominar as pessoas. Para piorar as coisas, eles veneram Yig, um dos Grandes Antigos, chamado de Pai das Cobras. Yig é uma divindade que demanda constantes sacrifícios e rituais macabros por parte de seus seguidores. Sua ira mortal se traduz na visita de serpentes venenosas na calada da noite.
Ao descobrir que a Irlanda era assolada pela presença de criaturas não humanas, Patrick deve ter ficado horrorizado. É possível que no contexto do Mythos ele tenha organizado a população local a enfrentar essa ameaça. Talvez ele tenha se tornado um líder que enfrentou as criaturas e cujo sucesso se traduziu na destruição completa do culto e de seus líderes. Quem sabe, Patrick conhecia alguma maneira de enfrentar as criaturas, visto que existem encantamentos capazes de revelar sua forma real. Seja como for, o culto foi derrotado. Como reconhecimento a sua façanha, o povo da Irlanda se converteu, acolhendo as suas crenças.
As histórias sobre os feitos de Patrick foram levadas através da Europa, em algum momento a verdadeira (e terrível) história perdeu seu contexto. A luta contra o povo-serpente se tornou a expulsão de serpentes normais. É possível entretanto, que a crônica desses fatos tenha de alguma forma sobrevivido em algum manuscrito em poder da Igreja, algo mantido trancado nos arquivos eclesiásticos.
O dia de St. Patrick é bastante popular na Europa, nos Estados Unidos e é claro, na Irlanda.
Saint Pat's Day é uma data festiva em que todos se vestem de verde (a cor da Irlanda) e usam broches "Kiss me, I'm a Irish" (beije-me, eu sou irlandês). Dizem que nessa data, beber cerveja pintada de verde garante que não vai faltar bebida o ano todo.
Talvez Patrick tenha sido também um inimigo do Mythos... quem sabe.
Mas para garantir, saúde!
terça-feira, 14 de março de 2023
Todas as Faces do Terror - Os Doze Subgêneros que formam o Horror (parte 2)
Terror com Criaturas
Livros e Romances sobre Terror com Criaturas:
The Abominable por Dan Simmons