Os conhecedores dos Mythos de Cthulhu sabem muito bem quem é o infame Abdul Al-Hazred.
Apesar desse personagem peculiar jamais ter aparecido em pessoa nas histórias de seu criador H.P. Lovecraft, é inquestionável que ele seja considerado um dos mais importantes. O Velho Abdul, que também responde pela alcunha de "O Árabe Louco" não é outro senão o autor do igualmente infame Al-Azif. Por sua vez, esse tratado de magia negra e feitiçaria, considerado como o depositário de todo conhecimento blasfemo dos Mythos ancestrais, entraria para a história através de seu título em grego - Necrononicom.
Do momento em que foi citado pela primeira vez por Lovecraft no conto The Hound em 1922, Al-Hazred e seu livro profano se tornaram nomes associados a toda mitologia lovecraftiana. É tamanha a conexão que Al-Hazred se converteu numa espécie de porta-voz do Mythos, o sujeito que detinha maior saber sobre esse terrível tema, e quem o difundiu através dos séculos vindouros. No cânon de Lovecraft, quando o árabe louco deitou sua pena sobre as páginas criando seu tomo, o mundo jamais seria o mesmo. Quanto mais se tentou deter esse conhecimento, mais ele se espalhou - trazendo com ele loucura.
Entretanto, embora Al-Hazred seja com certeza o mais conhecido Profeta do Mythos ele seguramente não é o único. Ele sequer é o único "árabe louco" associado ao Mythos.
Há outros personagens fascinantes ligados ao estudo soturno dos Deuses e Entidades Ancestrais. Alguns se notabilizaram pelos feitiços que levam seus nomes ou pelos tomos que escreveram. Alguns são bastante obscuros, reconhecidos por apenas alguns poucos estudiosos do Mythos, que encontraram textos com suas obras e fragmentos de sua pérfida biografia.
Nesta série de artigos seremos apresentados a alguns destes "árabes loucos": pensadores, teóricos e feiticeiros que detinham um saber atroz.
BARZAI
Chamado de "O Grande" pelas suas muitas façanhas místicas, Barzai nasceu em um pequeno vilarejo da Arábia Saudita em meados do século oitavo da era cristã. Membro de uma família de posses, ele era o quarto filho na linha sucessória, o que lhe permitiu devotar seu tempo para atividades acadêmicas que o levaram a estudar na prestigiosa Universidade de Al-Azhar. Há indícios de que Barzai chegou a estudar teologia e se graduar em filosofia islâmica, até que em algum momento sua atenção foi atraída para disciplinas menos ortodoxas.
Supõe-se que em algum momento durante seus estudos, Barzai tomou conhecimento das práticas profanas de feiticeiros que operavam nos bastidores da universidade. Não se sabe quem instruiu Barzai no universo do Mythos, mas sabe-se que sua ascensão foi meteórica, tão notável que aos 40 anos ele havia se tornado uma espécie de mestre entre os seus pares. O título "O Grande" lhe foi atribuído dentro dessa mesma Sociedade Arcana clandestina quando ele se converteu em seu líder.
A exemplo do célebre Al-Hazred (nascido quase um século depois), Barzai não foi um cultista devotado a Entidades ancestrais, embora tivesse interesse nos Deuses Exteriores Yog-Sothoth e Azathoth. Ele leu os Manuscritos Pnakóticos e os Sete Livros Crípticos de Hsan em suas versões originais e escreveu dissertações sobre eles. Barzai via os Mythos como um instrumento para obter poder e influência na sociedade do período e foi um mestre nisso. Um talentoso arcanista, Barzai forjou portentosos feitiços, sendo o mais famoso aquele conhecido como Cimitarra de Barzai que possui um capítulo no próprio Necronomicon.
Com idade avançada, Barzai se retirou do Mundo Desperto para a Terra dos Sonhos radicando-se na cidade de Ulthar próximo do Rio Skai. Lá ele expandiu seu conhecimento arcano investigando tomos que existiam apenas na dimensão onírica. Seu desejo por saber proibido, no entanto foi a sua perdição. Barzai empreendeu uma árdua jornada rumo ao topo do Monte Hatheg-Kla, a suposta morada dos deuses e onde Eles se reuniam para executar sua dança. Barzai jamais retornou dessa expedição, mas suas anotações foram reunidas por Atal, seu aprendiz, que nos anos posteriores copiou suas palavras numa coleção de pergaminhos que só existe no lendário Templo dos Antigos Deuses de Ulthar. Muitos feiticeiros tentaram obter acesso a esses documentos, mas até onde se sabe, Atal, já em idade venerável raramente concede aos postulantes o direito de folhear essas páginas.
Barzai é conhecido pelos estudiosos do Mythos graças ao já mencionado feitiço da Cimitarra de Barzai que cria uma espada de bronze usada para inscrever símbolos mágicos e afastar espíritos malignos. Abdul Al-Hazred considerava Barzai um dos maiores feiticeiros do Oriente Médio.
AKBAR IBN-BADAWI
Pouco se sabe à respeito de Akbar ibn-Badawi, além do que foi reunido pelos biógrafos que preservaram sua obra mais famosa o tratado Kitab Rasul Al-Akbarin (O Livro do Emissário Akbar). Atualmente sabe-se da existência de apenas três destes tomos guardados cuidadosamente em bibliotecas do Mundo Islâmico e tratados como livros de fábulas e gnosticismo medieval. É possível, entretanto que outras cópias constem em coleções particulares ou em prateleiras de instituições sob nomes falsos.
Diferente do que aconteceu com outros acadêmicos islâmicos que se debruçaram sobre o indigesto tema do Mythos, o Rasul Al-Akbarin sofreu menos censura e perseguição que outros livros, como o próprio Al-Azif cujas cópias foram sistematicamente destruídas. É possível que o tratado tenha sobrevivido graças a providenciais censuras realizadas pelos assistentes que compilaram versões mais suavizadas do tomo. Acredita-se na existência de volumes completos que não poupam o leitor de detalhes gravosos sobre os Grandes Antigos, em especial o obscuro Deus Huitloxopetl.
Um dos volumes remanescentes, presente no acervo da Biblioteca na Universidade al-Qarawiyyin em Fez, Marrocos fala brevemente sobre a vida de Ibn-Badawi num trecho ausente em outras edições. O autor teria nascido em algum ponto do Norte da África no século XIII na época sob controle do Mundo Islâmico. A biografia atesta que ele estudou sob a tutela de renomados filósofos muçulmanos do período. Há insinuações de que ibn-Badawi teria lecionado no Cairo onde teve contato com fragmentos do Al-Azif que sobreviveram aos expurgos teocráticos dos imanes. Ele teria traduzido alguns capítulos e incorporado trechos ao seu livro, sem citar a fonte original.
Numa esfera pessoal, Akbar ibn-Badawi teria sido perseguido por autoridades religiosas e preso no Egito sob a acusação de heresia. Ele foi libertado das masmorras cairitas graças a simpatizantes que o levaram para Damasco onde ele se estabeleceu até seu falecimento. O biógrafo assume que ele tenha se envolvido em uma tentativa de reunir partes perdidas do Al-Azif. Ele teria auxiliado no envio do livro para a Grécia onde o Compêndio Esotérico foi traduzido por Theodorus Philletas para o idioma helênico sob o título de Necronomicon.
Rumores sobre ibn-Badawi mencionam que ele possuía um estranho dom sensitivo que lhe permitia contatar os mortos. De fato, os boatos dão conta de que ele ouvia as palavras dos mortos sendo sussurradas para que ele as copiasse laboriosamente. Um dos fantasmas envolvidos seria o do próprio Abdul Al-Hazred, morto 200 anos antes em Damasco. Não há como atestar se essa informação é verdadeira ou mera invenção.
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Mas há outros feiticeiros, bruxos e estudiosos do Mythos como descobriremos nos próximos artigos.