segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

RPG do Mês - Starfinder: Aventura e Fantasia no Espaço Profundo (Parte 1)


Starfinder é comumente apelidado de "Pathfinder no Espaço", mas no meu entender é muito mais que isso.

Antes da resenha em si, um pouco de história: A Paizo Inc é uma editora que fez seu nome licenciando as clássicas revistas Dragon e Dungeon. Com a chegada da terceira edição de D&D ela começou a investir pesado na proposta de oferecer aventuras e suplementos para o sistema, aproveitando o open game license. Quando o sistema D20 começou a ser revisto lá por volta de 2008 (por conta da Quarta edição) a Paizo fez a sua jogada de mestre. Ao invés de acompanhar o curso, ela fincou os pés no Sistema D20 e criou o Pathfinder Roleplaying Game, um jogo com mecânica similar à terceira edição, mas com algumas mudanças espertas e muito bem pensadas.

O resultado?

Sucesso imediato! Pathfinder, lançado em 2009 se tornou um jogo muito querido por inúmeros fãs e conquistou seu espaço, abocanhando uma boa fatia do mercado, sobretudo depois que o D&D 4 não agradou a todos.

De lá pra cá, muita coisa aconteceu... entre elas, o lançamento de Starfinder.


Starfinder é o primeiro sistema 100% criado pela Paizo desde o lançamento do Pathfinder. De muitas maneiras ele é uma versão de Pathfinder adaptada para o gênero Ficção Científica, trazendo regras expandidas e adicionando algumas inovações ao sistema que se encaixam bem demais na ambientação.

O jogo bebe da fonte das famosas Space Operas e Cenários Espaciais, com direito a tudo que se tornou padrão nesse gênero. Há elementos de ficção e fantasia pulp mais ou menos ao modo de cenários medalhões como Dragonstar e Spelljammer, numa mistura incrivelmente equilibrada. As origens fantásticas de Starfinder são bem evidentes, uma vez que ele é influenciado diretamente pelo mundo de Pathfinder. Há naves espaciais, robôs, inteligência artificial, batalhas no espaço, exploração a planetas exóticos e saltos na velocidade da luz. Mas também há espaço para magia, armas encantadas, mortos vivos, monstros e tudo o que amamos em nossos mundos de fantasia. Então, é perfeitamente possível enfrentar invasores alienígenas e mergulhar em um buraco negro, ao mesmo tempo que se explora uma masmorra repleta de cyber kobolds ou os restos de uma estação orbital élfica amaldiçoada.

Originalmente anunciado como totalmente compatível com o Pathfinder, Starfinder tem algumas diferenças sensíveis, mantendo a vasta maioria de sua regras e mecânicas. O coração do jogo continua fiel às bases do D20, com o dado de vinte lados sendo usado para definir a maioria das ações dos personagens. Entretanto, há algumas diferenças entre Pathfinder e Starfinder, como as defesas e na maneira como funcionam os pontos de vida. Mas não se assuste: os jogadores encontrarão muito mais pontos de aproximação do que de distanciamento. Quem estiver minimamente familiarizado com o Pathfinder ou com a terceira edição do D&D vai reconhecer muita coisa e fica confortável para jogar. Da mesma forma, é perfeitamente possível adaptar ou usar monstros, itens e classes de Pathfinder em Starfinder e vice versa, permitindo assim uma troca de figurinhas entre os sistemas.

O Livro Básico de Starfinder é impressionante com uma contagem final de 524 páginas coloridas, com todas as regras necessárias para criar personagens, avançar com eles e criar aventuras. Também existe uma sessão dedicada ao Mestre com todas as informações pertinentes para quem quer narrar o jogo, bem como os detalhes e segredos da ambientação. Não estão incluídos os monstros, que integram o Arquivo Alienígena (Alien Archive), suplemento que faz as vezes do Manual dos Monstros.

Há três adições cruciais de mecânica em Starfinder: os Temas, Stamina Points (Pontos de Resistência) e Resolve Points (Pontos de Convicção).


À primeira vista, os Temas se assemelham bastante aos Traços de Pathfinder ou aos Backgrounds de D&D 5a edição. com uma combinação interessante entre os dois. Os temas fornecem uma série de proficiências para ajudar o personagem a se enquadrar em um  determinado papel, mas também fornecem benefícios e vantagens a medida que se avança. O livro apresenta nove temas, bem como a opção "sem tema" que permite ao jogador construir sua própria personalidade. Os temas presentes no livro incluem o piloto ás, o caçador de recompensas, o ícone, o mercenário, fora da lei, o sacerdote, o estudioso, o explorador e o buscador de raças alienígenas. É provável (até esperado) que futuros suplementos trarão novos temas, adicionando customização para novos personagens e mais opções de criação.

Além dos Temas, outra mecânica exclusiva do livro são os Pontos de Stamina, que é grosso modo uma segunda barra de energia. Cada personagem possui tanto Pontos de Stamina quanto Pontos de Vida (HP). Stamina representa os danos mais superficiais e exaustão, enquanto os Pontos de Vida auferem os ferimentos mais pesados e angústia mental. Os danos de Stamina são mais fáceis de serem curados do que os Pontos de Vida que em geral necessitam de magias e poções de cura para retornarem. Stamina pode ser restituída meramente descansando por alguns minutos. A mecânica é simples e funciona bem para desonerar os jogadores de ter que recorrer a cura a todo momento em que recebe um ataque.

Finalmente existem Resolve Points (Pontos de Convicção em uma tradução livre) que tem uma função similar ao Hit Dice de D&D mas que tem outras utilizações além de meramente curar. Gastando um Resolve Point, o jogador é capaz de curar todos os Pontos de Stamina perdidos, é como um segundo fôlego no qual o herói procura forças para superar adversidades. Resolve também pode ser utilizado para ativar certas habilidades. Por exemplo, a classe Mecânico pode gastar Resolve Points para criar um Drone capaz de espionar e seguir pessoas. Esses pontos também podem ser empregados para estabilizar o personagem que está morrendo, assim como sanar ferimentos para voltar ao combate. Esses pontos no entanto são consumidos cada round que o personagem está fora de ação - e se ele perder todos é incapaz de agir.

Tanto a introdução dos Temas quanto dos Resolve Points são ótimos exemplos de como Starfinder é eficiente ao pegar regras interessantes (Backgrounds e Hit Dice) e adaptá-las adicionando novas funções e um sabor todo especial.

O livro é dividido em 13 capítulos. A maioria das sessões são bastante tradicionais em qualquer livro básico que se preze. Portanto está presente uma apresentação com o conceito de RPG e duas páginas com um exemplo de uma sessão. Esse método para descrever o jogo é usada várias vezes ao longo do livro, com exemplos bem elucidativos envolvendo armadilhas, combate, batalhas estelares e perseguição de veículos.


Starfinder introduz um leque de sete novas classes e sete raças (espécies alienígenas) que podem ser escolhidas para construir os personagens.

A maioria das classes são análogas a arquétipos dos mundos de fantasia.

Há duas classes de utilizadores de magia com um amplo repertório de feitiços e dádivas com efeitos devastadores. Os Místicos (Mystics) são basicamente os clérigos da ambientação, com uma lista de magias fornecidas por divindades superiores e forças astrais. Já os Technomancers são similares aos magos, que aprendem a canalizar energias sobrenaturais e invocar efeitos impressionantes. Operativos (Operatives) fazem as vezes de Ladinos com uma variedade de habilidades úteis em exploração, furtividade e infiltração, eles possuem até mesmo um equivalente a Ataque de Oportunidade chamado "Ataque de Truque". Os Soldados (Soldiers) são o equivalentes a Guerreiros com acesso a armamento mais pesado, armaduras e um surtimento maior de pontos de vida para que possam encarar os inimigos frente a frente.

Mas há classes que são realmente únicas, como os Solarians que são uma espécie de Monge (mas sem o ranço da classe) capazes de emular os Jedi de Star Wars. Eles utilizam armas feitas da energia estelar e empregam técnicas marciais que lhes concedem certo domínio sobre a gravidade e poderes sobrenaturais. Eu gostei muito da proposta dessa classe e foi uma das que mais me chamou a atenção.

O Mecânico (Mechanic) é uma outra inovação de Starfinder que casa perfeitamente com a ambientação. Eles são capazes de hackear computadores, interferir no mainframe de máquinas, confundir Inteligência artificial e assumir comando de veículos, desde carros flutuantes até naves espaciais. Também são especialistas em criar drones que utilizam defensiva e ofensivamente, ganhando uma série de vantagens. Os Mecânicos podem ter um tipo de drone de estimação ou um Exocortex, que funciona como um computador de apoio alojado no cérebro.

Finalmente o Envoy é o ideal para os jogadores que gostam de diplomacia e negociação. Trata-se de uma classe focada em habilidades sociais, com um amplo repertório de truques. Com esses truques, eles podem coordenar os esforços de aliados e prejudicar os inimigos durante a batalha. O Envoy me lembrou um bocado o Bardo, mas com algumas habilidades especiais que emulam o papel dele como negociador.


As classes possuem uma boa descrição e possuem suas próprias listas de façanhas e capacidades (Feats Perks) que podem ser adquiridos a medida que se ganha experiência. Com uma grande variedade de opções, os jogadores podem variar bastante seus personagens e torná-los algo único. Claro, isso significa que é interessante construir o personagem com cuidado e escolher de maneira consciente as vantagens que vão permitir a progressão desejada, como acontecia no D&D 3th.

De um modo geral, eu gostei de todas as classes apresentadas e mais ainda das possibilidades de aperfeiçoamento e progressão. Mesmo as que aparentam ser mais "corriqueiras" como o Soldado ou o Místico possuem características próprias e um flavor de novidade muitíssimo bem vindos.

Se há uma coisa em que Starfinder se destaque em oferecer de maneira inovadora, essa coisa são as opções de classes. Conforme dito, são sete raças, ou melhor dizendo, espécies alienígenas à disposição dos jogadores. Essas raças fornecem uma variedade considerável que vão de seres fortes e pesados até outros que são pequenos e furtivos. Cada raça possui seus próprios méritos e capacidades e estas são bem descritas.


Assim como acontece com as classes, algumas delas oferecem uma perfeita analogia com as raças de fantasia consagradas. São eles:

Os Vesk são uma raça de répteis humanoides grandes e pesados, mas com uma enorme resistência e tolerância ao dano. Eles são uma ótima opção para classes que querem bater e causar dano maciço nos inimigos. São também uma raça conquistadora e expansionista que se lança nas estrelas com um forte desejo por glória.

Os Ysoki são uma espécie de elusivos roedores espaciais semelhantes a camundongos com grande propensão a se meter em encrencas e causar confusão. São mestres em tecnologia e adoram novidades, deixando-se levar pelo desejo de aventuras e a curiosidade a respeito do universo que os cerca.

Humanos estão obviamente à disposição oferecendo capacidade de adaptação e equilíbrio, como sempre. Os humanos podem se adaptar tranquilamente a qualquer classe e seguir uma progressão que lhes permite atingir vários objetivos.

Os Androides são um excelente acréscimo ao cenário sendo uma variante dos humanos com melhorias cibernéticas orgânicas e mecânicas. Construídos pelos humanos para servirem aos seus caprichos, eles conquistaram a liberdade e agora trilham seu próprio caminho.


A ancestral raça dos Lashuntas possuem poderes psíquicos e capacidades mentais impressionantes. Seus membros são divididos em duas subespécies distintas, uma alta e esguia com capacidades latentes e uma baixa e mais forte. Os Lashuntas são extremamente charmosos e conquistam as demais raças com seus costumes e tradições.

As duas últimas espécies talvez sejam as mais interessantes - os Kasatha e os Shirren.

Os Kasatha são uma raça dotada de quatro braços, semelhantes aos marcianos verdes de John Carter. Eles são misteriosos e vieram de uma parte distante do espaço, viajando em uma gigantesca nave que era basicamente seu mundo natal. Os Kasatha possuem uma rica cultura e sempre cobrem a boca. Quatro braços fornecem uma vantagem significativa em combate permitindo entre outras coisas, manejar quatro armas simultâneamente.

A espécie dos Shirren, uma raça de seres insectóides também oferece um background curioso. Originalmente eles eram membros de uma mente coletiva em forma de colônia (similar aos Zergs de Starcraft) cujos objetivos eram expandir e conquistar os mundos à sua volta. Alguns deles conseguiram se libertar de sua colônia conquistando a liberdade e a capacidade de ditar suas próprias escolhas. São altamente individualistas e pacíficos, mas defendem a liberdade que conquistaram ferrenhamente.

Além dessas raças básicas, existe a opção do jogador optar pelas raças clássicas de Pathfinder, levando assim anões, elfos, orcs e todas as outras para viver aventuras no espaço.


Cada raça possui um background detalhado de suas capacidades, virtudes e defeitos, vantagens e desvantagens que ajuda muito a situar cada uma delas na ambientação. Além de estatísticas, o jogador encontra também detalhes a respeito de sua sociedade, costumes, nomes típicos, alinhamentos mais comuns, relações com outras raças, e quais as classes mais favoráveis. Algo muito bem vindo são as caixas de texto onde o jogador encontrará razões para escolher determinadas raças - e como as demais irão tratá-lo.

Habilidades e Façanhas são um elemento central em Starfinder, assim como acontece em Pathfinder. O quantidade de habilidades foi reduzida e concentrada, para diminuir a lista de opções e facilitara  dispersão de pontos. Existe um total de vinte habilidades incluindo Atletismo, Computadores, Engenharia, Percepção e Pilotagem. Espalhar pontos nelas é algo fácil e intuitivo.

Além disso, o capítulo a respeito das habilidades fornece detalhes de como cada habilidade pode ser utilizada e o que os personagens podem descobrir empregando-as. Uma vez que as habilidades foram concentradas, elas podem produzir uma enorme variedade de efeitos quando invocadas - por exemplo Atletismo inclui praticamente todas as modalidades que envolvem esforço físico e coordenação, de nadar a correr, de saltar a escalar. Já Engenharia permite montar explosivos, reconhecer máquinas e operá-las, construir objetos de tecnologia, reparar itens etc...

Façanhas continuam extremamente importantes em Starfinder, assim como são em Pathfinder. Façanhas concedem uma vasta gama de vantagens e benefícios imediatos que vão de melhorar os rolamentos de defesa, garantir especialização em armas, fornecer movimentos e manobras em combate entre outras coisas. É claro, para comprar algumas façanhas é preciso atender a uma série de pré-requisitos. Isso demanda planejamento e estratégia para que a progressão seja perfeita.


Gostou do que leu até aqui? Isso é só o começo...

Então nos acompanhe na continuação do Artigo onde vamos falar da ambientação, dos equipamentos, de alta tecnologia, das naves e de muitos outros detalhes desse jogo incrível.

Ah sim, Starfinder está em Financiamento Coletivo, trazido pela Editora New Order. Se você não sabe disso, dá uma olhada aqui no link:

STARFINDER - Financiamento Coletivo

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