E aí pessoal?
Mês passado tivemos mais uma edição do Dungeon Carioca na Zona Oeste do Rio de Janeiro. O encontro como sempre foi muito divertido, dessa vez contando com a presença de dois convidados especiais; Igor Moreno autor de Space Dragon e Alexandre Lancaster criador do RPG Brigada Ligeira Estelar. Os dois fizeram uma pequena palestra sobre os seus jogos, falaram das ambientações, de sua experiência lançando seus trabalhos no mercado brasileiro e do que os leitores podem esperar futuramente para os seus cenários espaciais.
O tema desse Dungeon Carioca era Ficção Científica, portanto as mesas programadas para o dia tinham essa temática onde figuravam naves espaciais, alienígenas, armas laser e outras traquitanas modernosas.
Eu procurei por algum cenário de Call of Cthulhu que se passasse no espaço para narrar. À princípio, pensei em dois candidatos: "Blood Moon" (do módulo Strange Aeons) e "My Little Sister wants you to suffer" (cenário de Cthulhu Britannica). Os dois tem seus méritos, mas não achei nenhum deles especialmente interessante para a ocasião. Acabei então fechando com uma terceira opção, o ATO 3 da série The Curse of the Yellow Sign escrita por John Wick. Essa mini-campanha (não necessariamente encadeada) trata de um mesmo tema em diferentes épocas, mostrando que a presença maligna dos Grandes Antigos (em especial Hastur e seu Avatar o Rei Amarelo) acompanham a humanidade não importa onde e quando.
O Ato 1 "Digging for a Dead God" já foi resenhado aqui no Blog pelo nosso colega Clayton Mamedes e muitos o consideram como o melhor trecho. O primeiro ato se passa nas selvas africanas no início da década de 1940 com os jogadores interpretando soldados alemães envolvidos com uma misteriosa escavação. O segundo ato "Calling the King" se passa na virada de 1999 e narra as trágicas consequências da leitura de uma peça teatral considerada amaldiçoada. Finalmente, o terceiro ato intitulado "Archimedes 7" se passa originalmente num futuro não determinado, mas que eu preferi situar em 2.129. Parecia ser o cenário ideal para a ocasião; afinal ali estavam elementos de ficção científica bem claros e a mistura única de horror cósmico e sci-fi podia resultar em algo bem diferente.
Mas infelizmente não foi bem o que aconteceu...
Não sei explicar direito, talvez eu não tenha preparado direito a estória ou pode ter sido resultado da noite mal dormida por conta de uma gripe. Fato é que a aventura não rendeu o que eu esperava. Uma coisa que no meu entender é essencial em Call of Cthulhu (e qualquer cenário investigativo) é o clima de mistério e apreensão. Acho que esse cenário deixou um pouco a desejar nesses quesitos (ou eu mesmo não consegui imprimir isso na narrativa).
Isso não quer dizer que a estória seja ruim. Eu fiz algumas mudanças no contexto da estória e inseri alguns elementos diferentes que ao meu ver poderiam tornar o cenário mais ágil, mas no fim foi justo o contrário. Na minha opinião "Archimedes 7" (ou ao menos a versão que mestrei) sofreu de um caso crônico de "Deux ex-Machina" uma circunstância em que as ações dos jogadores não influem no curso da estória não importa como eles tentem alterá-lo. E isso em alguns momentos pode ser frustrante para os jogadores.
Algumas fotos da sessão:
Bom, como não pretendo mestrar novamente Archimedes 7 posso descrever como foi o cenário detalhadamente sem me importar com a possibilidade de estragar a diversão para um próximo grupo.
Uma idéia que um dos jogadores deu ao terminar a aventura é que ela poderia ter sido mais interessante se usada na ambientação "Abismo Infinito" do John Bogéa. Curiosamente eu até havia pensado nessa possibilidade, mas acabei optando por CoC esperando levar o cenário para uma província diferente (o espaço) como forma de variação do tema. Se algum dos leitores se sentir motivado a usar esse roteiro em Abismo Infinito, eu sem dúvida gostaria de ler sobre os resultados e de como foi a experiência.
Bom antes de descrever a aventura deixem eu situar o contexto do cenário e fazer a apresentação dos personagens dos jogadores.
ARCHIMEDES 7
Archimedes 7 é o nome de uma imensa Nave Colonial de Viagem em Espaço Profundo. A Nave é um engenho que permite singrar o espaço em altíssima velocidade (acima da luz) e realizar viagens de longa distância.
A missão da Archimedes 7 é transportar uma equipe de colonos e engenheiros até o distante planeta Atlas. Esses colonos à serviço da mega-corporação Weyland-Yutani (tan-tan-tan, sim, exatamente aquela da série Alien) tem como tarefa realizar o procedimento de terraformação do planeta tornando-o apto para sustentar vida a longo prazo. O projeto prevê um tempo mínimo de 10 anos de permanência em Atlas, tempo em que o grupo construiria uma base, ergueria geradores e começaria a trabalhar o solo inserindo matéria vegetal que iria originar um ecossistema. Tudo muito bonito e dentro do slogan da corporação "construindo mundos melhores".
Para suportar melhor a longa jornada, todos os 160 colonos contratados para o trabalho viajam dentro de câmaras de hibernação, "destrutando" dos dúbios benefícios de um sono criogênico. O computador de bordo, um mecanismo dotado de Inteligência Artificial (I.A.) apelidado de Archie toma conta deles, encarregado de providenciar um sono tranquilo e sem maiores eventos durante os dezoito meses de viagem. Além dos colonos e do computador de I.A. a Archimedes conta com nove experientes tripulantes que se revezam nas atividades necessárias para manutenção e navegação da nave.
Fisicamente a Archimedes é um IMENSO veículo espacial, mas ele é antes de tudo uma nave de carga. Seus depósitos estão abarrotados de equipamento para a construção da colônia e das câmaras de hibernação. O restante da nave é dominado por maquinário pesado, os colossais motores trans-dobra, geradores e outros mecanismos de alta tecnologia. Cerca de 70% da nave é composta desse maquinário pesado, o que faz da Archimedes um ambiente cinzento, frio e pouco acolhedor, com mega-geradores pulsando e zunindo e com energia sendo transportada por inúmeros cabos como as veias de um super organismo. Não é à toa que a tripulação viaja em animação suspensa, viver e trabalhar nesse ambiente inóspito é para poucos indivíduos especialmente talhados para a função.
Além da Archimedes, uma segunda nave faz parte da missão. Trata-se da Nefarious uma nave acoplada cuja função é servir como depósito de combustível concedendo a matéria prima para alimentar os motores da nave principal. A Nefarious é parte essencial da missão; ela carrega geradores e ao chegar a Atlas será usada para desembarcar a equipe de colonos. Uma vez em solo o plano é desmantelar a Nefarious que servirá de abrigo para a equipe nos primeiros e duros anos da missão.
Os Personagens dos Jogadores
"Archimedes 7" é um cenário para seis jogadores prontos criados especialmente para esse one-shot. Eu preferi criar meus próprios personagens ao invés de usar os que vinham originalmente na sessão final do livro. Essa decisão foi motivada pelas minhas mudanças na estrutura original da trama e vou falar sobre ela no momento adequado. Alguns dos personagens são bem estereotipados, o que é proposital para facilitar a interpretação deles já que cada um foi entregue aos jogadores ao acaso.
Função: Engenheiro Mecânico e "faz-tudo"
Histórico: Você sempre considerou a si mesmo mais um mecânico
do que um engenheiro. Você nunca teve problemas em sujar as suas mãos, montar e
desmontar equipamento e fazer o necessário para que as máquinas não falhem.
Esse é seu dom, manter as coisas em ordem. Você se ressente que nem todos dão o
devido valor a sua função, a não ser é claro, quando as máquinas os deixam na
mão.
Você aceitou o atual trabalho apenas pelo pagamento.
A Companhia irá pagar um salário equivalente a cinco vezes o que você receberia
em casa. É um ótimo contrato! Mais dinheiro do que você jamais viu em sua vida!
Melhor impossível certo? Bem, quase. Sua mulher e as crianças ficaram em casa,
esperando você ajudar a construir essa colônia e quando tudo estiver pronto
você espera trazê-los. Mas você sabe que vão ser necessários anos para
conseguir juntar o bastante para pagar a vinda deles. E se nesse meio tempo as
crianças esquecerem o rosto de seu pai? E se sua mulher cansar de esperar? E se
alguma coisa “inesperada” acontecer? Você perdeu algumas noites de sono com
esse pensamento e tenta afastá-lo mergulhando de cabeça no trabalho.
É isso! Se há algo de bom nisso tudo é que
você terá muito trabalho pela frente. Agora pare de pensar bobagem e volte ao
trabalho, tem muito a ser feito!
Função: Psicóloga/ Assistente Social
Histórico: Todos precisam de um ombro amigo, todos precisam desabafar. E isso é verdade, sobretudo em um ambiente complicado de trabalho. Poucos trabalhos podem ser mais estressantes do que aquele realizado pelos homens e mulheres que exploram o espaço profundo. Por isso sua função, quando a colônia for fundada, será essencial. Sim eles precisam de engenheiros, de operários e mecânicos, mas todos estes vão precisar dos seus conselhos. Sua tarefa é de suma importância, pois você é capaz de tratar dos perigos invisíveis que afligem a mente humana. Sua especialização em psicologia espacial lhe permite tratar de males que ainda pouco conhecidos.
Você planejou cuidadosamente essa viagem e
ansiava trazer seu marido e filhos para iniciar uma nova vida ao seu lado. Mas
então veio o inesperado... Você ainda está de luto, lamentando pela tragédia
que levou sua família em um violento acidente automobilístico. Foi difícil
provar aos seus empregadores que você ainda estaria apta para o serviço. Mas
esse trabalho é tudo que lhe resta. Você espera ser capaz de fazer o melhor e
seguir adiante com sua vida.
Um sentido, uma direção, é tudo o que você precisa.
Função: Engenheiro de Produção/ Gerente/ "Homem da Companhia"
Histórico: Finalmente chegou a sua vez!
Na Terra, os manda chuvas da companhia
observavam de perto seu desempenho e na hora de colher os frutos você acabava
de fora. Você perdeu as contas de quantas vezes foi passado para trás dessa
forma. A grande verdade é que no mundo corporativo, bem como na natureza,
sempre vai haver um peixe maior no oceano disposto a devorar os pequenos. A
solução? Procurar um lugar onde você possa crescer. E que lugar pode ser melhor
do que nas Colônias Exteriores?
Tudo bem é um ambiente hostil, mas você já
está habituado. Tudo o que você precisa fazer é controlar as coisas e fazer com
que a Colônia prospere. Se dentro de cinco anos você conseguir transformar esse
investimento em um sucesso, os chefões da Weyland Yutani vão implorar para que
você volte. Então é hora de arregaçar as mangas e fazer com que essa colônia dê
lucro, nem que tenha de esfolar cada um desses colonos miseráveis.
Chega
de ser um peixe pequeno! Grandes coisas virão...
Função: Supervisor de Suprimentos/ Cozinheiro
Histórico: Você nasceu para isso. Para ser uma espécie de peregrino do espaço, um tipo de cigano sem um destino final. Você já trabalhou a bordo de outras tantas naves acumulando inúmeras funções. Você está acostumado a sentir o tremor dos motores de impulso, a respirar o ar reciclado dos dutos de ventilação e dormir em câmaras hibernação criogênica. Faz tanto tempo que está nessa vida que nem lembra como era antes. Cargueiros, estações, fragatas militares, transportes...
Nessa nave, a Archimedes 7 você não passa de
um cozinheiro. Mas pouco importa. Você tem a chance de conhecer outro planeta,
ver coisas em primeira mão, de participar da construção de uma Colônia. Ora
essa, se isso não é uma aventura o que mais seria?
Dane-se que você está ficando velho e a
artrite tem incomodado. Ainda há muito para ver e conhecer nesse universo e
você ainda pode mostrar a eles que esse cachorro velho pode aprender um ou
outro novo truque.
Função: Operário/ Empreiteiro
Histórico: Você sabe muito bem porque está aqui.
Você ferrou com as coisas tantas vezes que
esse é o único lugar para onde poderia ir. Uma rocha estéril, chamada Atlas
flutuando a sete mil anos luz de casa vai ser o seu novo lar.
Você já trabalhou em outras colônias de terra-formação
e sabe o que esperar. É trabalho duro, pesado e sem descanso, mas é a única
coisa que você sabe fazer. Você já minerou asteroides banhados por radiação,
construiu bases em luas escuras e túneis em planetas cobertos de poeira
vermelha. Da última vez, você prometeu que não voltaria. Que era melhor se
assentar em algum lugar, casar e abrir um pequeno negócio. Mas as coisas não
saíram como você esperava: uma separação, os negócios que não iam bem e logo o
que sobrou foi voltar ao ponto onde havia começado.
O espaço não tem segredos para você; é só um
lugar frio e escuro onde quem tem bom senso não deveria ir. Para quem não tem o
que perder? É um lar.
Dra Monica Cheung
Função: Médica e Clínica Geral
Histórico: Porque se aventurar em uma colônia nas
Colônias Exteriores? Para que abandonar tudo e se tornar uma médica em um
planeta esquecido que sequer tem atmosfera própria? Simples, porque não sobrou
nada para você em outro lugar.
Depois de se formar você trabalhou no Corpo
Médico Colonial e foi mandada para uma lua nos limites da civilização. Apesar
das dificuldades você adorava o desafio. Você passou seis anos lá, trabalhando
como médica assistente até que a colônia foi assolada por uma epidemia
desconhecida. Cada um de seus amigos e vizinhos morreu e não havia nada a fazer.
Você sobreviveu por milagre, pois fazia parte dos 10% sortudos imunes à
degeneração. Você sabe que fez o melhor possível para ajudar os colonos, mas
não foi o bastante e em seu íntimo sabe que jamais será capaz de se perdoar.
A Colônia de Atlas é uma segunda
oportunidade. Uma chance para enterrar o passado e exorcizar os fantasmas do
que aconteceu. Quem sabe em um novo ambiente você possa fazer a diferença.
Esses foram os personagens dos jogadores. O que aconteceu à bordo e o fim de cada um, estará no próximo artigo.
Ansioso, esperando aqui...
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