quinta-feira, 17 de novembro de 2022

O Farol no Fim do Mundo - A Ilha mais isolada da Costa da França


Localizado na ponta ocidental da Bretanha, na França, encontramos um trecho de mar açoitado por  fortes ventanias conhecida como Estreito de Raz de Sein. Pontilhada por uma cadeia remota de ilhas rochosas estéreis e baixios implacavelmente golpeados por ondas maciças de até 20 metros, é um lugar complicado de visitar. 

Por muito tempo, o estreito representou uma ameaça para os navios que passavam por essas águas traiçoeiras e agitadas. Não foram poucas as embarcações avariadas ou mesmo naufragadas por conta das rochas ocultas. 

Empoleirado em uma das ilhas do estreito, pouco mais que um aglomerado rochoso projetando-se na espuma, há um farol chamado “Phare de Tévennec”, ou “Farol de Tévennec”. Bem no meio do mar feroz e cinzento, ele se mantém ali, abandonado e sozinho, quase como se flutuasse sobre as ondas cortantes. Parece algo saído de um filme de terror, o que é apropriado, já que esta pequena torre isolada tem uma história sombria e a fama de ser um dos lugares mais assombrados da França.

A ilha onde o farol foi erguido Chaussée de Sein, há muito tempo é considerada um grande perigo para a navegação. Para confuzir os navios atraves desse aglomerado de rochas, uma série de faróis foram construídos a partir do século XVIII, sendo o Farol de Tévennec um deles. Estas águas escuras são especialmente ruins para os navios, com as correntes empurrando embarcações para sua boca escancarada, como se a ilha fosse uma fera faminta. De fato, as rochas de Tévennec são tão cruéis e mortais que os marinheiros diziam que a ilha era o covil de Ankou, o Companheiro da Morte, que devorava as almas dos vivos. Segundo o mito bretão era possível ouvir os lamentos horríveis das vítimas de Ankou presas em sua caverna sob a ilha. A região era tão temida que os marinheiros franceses apelidaram o local de Estreito do Inferno tamanho o número de tragédias e mortes registradas ali.
 

Um grande número de navios encontrou seu destino lá,, principalmente durante as Guerras Napoleônicas. O naufrágio mais grave ocorreu em 1796 quando o navio francês Séduisant foi arremessado contra as rochas em Tévennec. A embarcação transportava mais de cem feridos para um hospital e os homens, muitos deles moribundos, não tiveram a menor chance de sobreviver. Corpos e destroços foram recolhidos por meses das águas geladas.

Depois dessa tragédia, erguer o Farol se tornou uma necessidade. Contudo isso não significava que a tarefa seria simples. Operários foram trazidos em regime de revezamento para o trabalho marcado por pelo menos meia dúzia de mortes e estranhos acidentes. O Farol finalmente ficou pronto em 1832, após cinco anos de obras interrompidas pelas fortes tempestades que assolavam a ilha. Projetado para funcionar com uma equipe mínima, o Farol foi posteriormente adaptado para ter apenas um único guardião que cumpriria contrato de um ano.

Não era um trabalho para qualquer um: ficar completamente sozinho naquele pedaço de rocha cercado pelo mar gelado podia enlouquecer o mais razoável dos homens. O operador ficava ali sozinho com os próprios pensamentos e mais ninguém. Um ano poderia parecer uma eternidade em meio à solidão sufocante. O primeiro faroleiro de Tévennec não completou seu contrato e deu início a sinistra reputação do farol no fim do mundo.

O primeiro sujeito incumbido do serviço foi um marinheiro veterano de 45 anos chamado Henri Guezennec. Ele tinha experiência prévia como faroleiro em outras ilhas, mas logo ficou claro que encontraria condições inesperadas em Tevénnec. Estranhos fenômenos começaram a ocorrer quase que imediatamente. Em seus diários bastante detalhados Guezennec alegava ver figuras sombrias espreitando nas rochas e ouvir vozes fantasmagóricas que lhe diziam incessantemente para sair do farol. Além disso, ele começou a sofrer com insônia  o que atrapalhava seu trabalho. A história diz que em poucos meses Guezennec ficou completamente louco e teve que ser dispensado do dever. Ele foi resgatado por um navio, mas a essa altura estava  incoerente contando histórias distorcidas sobre fantasmas, horrores marinhos e claro, Ankou.


Um substituto chamado Maxim Minou foi enviado para seu lugar, e ele também aparentemente teve experiências estranhas lá. Minou enlouqueceu em pouco mais de seis semanas e o farol parou de ser aceso. Vieram resgatá-lo, e tiveram de levá-lo dali para um manicômio.

Dois faroleiros perdendo a cabeça dessa maneira e em tão pouco tempo foi definitivamente algo inesperado. O governo francês decidiu enviar para Tévennec dois operadores ao invés de apenas um, considerando que a solidão era a causa para o fracasso da missão. Contudo, isso parece não ter resolvido o problema. 

Durante os primeiros três meses operando na ilha um dos faroleiros designados para o serviço sofreu uma queda e morreu. Um substituto foi enviado, mas sequer chegou ao farol, vindo a falecer enquanto rumava para lá. Um terceiro acabou ficando apenas dois meses e foi encontrado morto em sua cama. Uma nova equipe foi enviada, dessa vez, formada por pai e filho numa tentativa de facilitar a relação entre os guardiões. De nada adiantou, o mais velho cortou a própria garganta com uma navalha depois de enlouquecer completamente. 

E isso tudo ocorreu em um período de apenas DOIS ANOS! 

Depois dessa sucessão de mortes, o farol passou a ser considerado amaldiçoado, assombrado, ou ambas as coisas. Um padre foi trazido até o lugar para exorcizá-lo e uma cruz de ferro foi fincada nas rochas como uma maneira de manter o mal afastado. Mas de nada adiantou...

O governo ajustou as regras para que os faroleiros casados ​​pudessem trazer suas esposas e filhos para a ilha. Isso parece ter funcionado por um tempo, com os primeiros casais não tendo problemas particulares além do isolamento, mas o marido de uma família que se mudou morreu quando acidentalmente caiu sobre uma faca. Outra tragédia ocorreu em 1907 quando uma tempestade derrubou um muro e matou uma mulher enquanto ela dormia. Tudo isso contribui para aumentar a infame lenda sobre o Farol de Tévennec e sua maldição.


Em 1910, o farol tornou-se automatizado, permanecendo assim até hoje. Por décadas o farol de Tévennec ficou desabitado, sendo completamente evitado por moradores supersticiosos. Ocasionalmente havia relatos de luzes misteriosas e estranhas formas que eram vistas pelos navios passando ao longe. 

Parecia que as pessoas estavam felizes em deixar aquela ilha sombria e as forças insidiosas que a habitavam, tornando-a uma lembrança do passado. Uma vez que rotas alternativas foram adotadas, a Ilha se tornou cada vez menos importante e a operação do Farol demandava menor interesse. Ele acabou sendo desativado em 1998 e a luz substituída por boias de sinalização. Sem manutenção, o prédio e farol caíram rapidamente em abandono.

Contudo, em 2015, Marc Pointud, presidente da National Society for Heritage, Lighthouses and Beacons (Sociedade de Herança Nacional de Faróis), iniciou uma campanha visando restaurar o Farol de Tévennec. Pointud visitou o local abandonado há anos e decidiu se estabelecer lá por dois meses como parte de uma campanha de marketing para defender o farol. 

Ele obviamente conhecia as muitas histórias de assombrações e maldições, mas não se importou com as lendas. Pointud desembarcou na ilha de helicóptero e lá viveu em acomodações escassas e básicas. Durante sua estadia, quando perguntado se havia experimentado algo paranormal, relatou o seguinte:

"Não... Mas devemos colocar essas histórias de maldições no contexto do século XIX. Lendas, superstição e religião se misturavam e esse é um ambiente austero, para dizer o mínimo. Os guardiões estavam realmente separados do resto do mundo. Eles sofriam com isolamento e isso pode causar reações psicológicas graves.  Este não é o meu caso, no século XXI eu consigo me comunicar via satélite. Não me sinto sozinho, mas consigo entender o que significava para esses homens viver aqui sem o menor contato exterior."


Pointud completou sua estadia sem incidentes e gostou tanto que planeja transformar o velho farol em atração turística abrindo a casa para pessoas interessadas em conhecer um sítio histórico e quem sabe, até passar uma noite num lugar supostamente assombrado.

E então, qual o veredito sobre esse Farol? Seria ele assombrado ou Maldito? Ou é apenas um lugar profundamente misterioso, esquecido e isolado que afeta a imaginação de pessoas deixadas sozinhas? 

Talvez a única maneira de saber seja visitar o local e passar algum tempo sozinho neste fim de mundo, tendo apenas a companhia de seus pensamentos... e quem sabe dos fantasmas.

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