Todo mundo adora rir. Quem não ama uma boa gargalhada? São coisas que trazem alegria, nos curam e nos unem como nada mais. O mundo realmente precisa de mais riso, e dizem que o riso é o remédio da alma.
Mas eis aqui uma questão: E se a doença em si for o riso? E se você começasse a rir um dia e não conseguisse parar até ficar incapacitado? Dizem que o riso é contagioso e, de fato, Charles Dickens disse certa vez: "Não há nada no mundo tão irresistivelmente contagioso quanto o riso", mas e se tudo isso fosse literal e pudesse ser um tipo de doença? E se essa doença se espalhasse, contagiando todos à sua volta? Por bizarro que possa parecer (e de fato é), foi exatamente isso que aconteceu em uma remota aldeia africana no ano de 1962, quando as pessoas começaram a cair em uma risada contagiante que se tornava incontrolável a ponto de ser perigosa.
Tudo começou em 31 de janeiro de 1962, em um internato para meninas em Kashasa, na costa oeste do Lago Vitória, em Tanganika, Tanzânia, na África. Começou de forma discreta e inocente, uma aluna começou a rir repentinamente, depois outra, mais uma e então a coisa foi se tornando estranha, beirando o bizarro. As gargalhadas incontroláveis, sem motivo aparente se multiplicavam nos momentos mais inapropriados e inoportunos.
No início era apenas uma curiosidade, mas depois começou a se espalhar, com mais e mais alunas demonstrando acessos incontroláveis de riso irrestrito. Algumas, por traz das risadas beirando a histeria demonstravam uma preocupação com o que pudesse estar acontecendo consigo mesmas, a medida que a reação emocional não cessava. De uma sala de aula, a estranha condição se espalhou para toda a escola, para a perplexidade de pais e professores que permaneciam imunes aos efeitos. Tudo aquilo era tão estranho que a escola se viu forçada a fechar as portas até que a situação se resolvesse.
Mas isso foi apenas o começo!
Os misteriosos acessos de riso se espalhariam da escola para o resto da vila e arredores, até afetar mais de mil pessoas segundo estimativas e registros da época. Os sintomas da condição inexplicável incluíam ataques recorrentes de riso e, inversamente períodos de choro ou gritos, dor geral no corpo, fadiga física-mental, desmaios, problemas respiratórios, erupções cutâneas, que duravam de algumas horas até 16 dias e tinham efeitos colaterais, incluindo inquietação, energia nervosa excessiva e explosões de violência ocasional. Em alguns casos, as crianças submetidas à condição riam até perder a consciência, ficavam sem ar, desmaiavam e precisavam de socorro. Sofriam ainda de violentos espasmos e em casos esparsos convulsões. Riam com tanta força que sentiam náuseas e por vezes vomitavam. Outras eram incapazes de ingerir alimentos e água, tamanha a intensidade de suas gargalhadas. Era algo totalmente inexplicável e que permanece como um mistério difícil de se contextualizar.
Risadas são geralmente algo bom, mas daquela maneira excessiva, poderia vir a ser perigoso. Parecia não haver fim para a curiosa epidemia que seguia se espalhando para outras aldeias, chegando até a invadir a nação vizinha de Uganda. Os jornais estampavam manchetes sobre a "Epidemia de Risada" e demonstrava uma séria preocupação com o que poderia acontecer. A essa altura, algumas vítimas já haviam sido internadas em hospitais locais. Um dos temores era que a condição fosse apenas a primeira fase de uma doença ainda mais séria e desconhecida que poderia trazer virtualmente qualquer efeito danoso e inesperado.
Os tanzanianos chamavam aquela estranha doença de "Omuneepo", que pode ser traduzido como "a doença da gargalhada". Os médicos e cientistas chamados às pressas para investigar a causa não conseguiram encontrar nenhuma razão física para as explosões, mesmo quando elas ficaram tão severas que algumas crianças tiveram de receber tranquilizantes.
A epidemia misteriosa continuaria por aproximadamente 18 meses, período em que os sintomas desapareciam e ressurgiam nas vítimas, sem que nenhum padrão pudesse ser compreendido. A curiosa doença do riso, tão misteriosamente quanto se iniciou, começou a desaparecer abruptamente, deixando médicos e cientistas perplexos.
O que teria acontecido na Tanzânia durante aquele estranho período? O que teria causado essa doença, até onde se sabe, única nos anais da medicina contemporânea?
Uma das teorias é que foi algum tipo de doença psicogênica ou sociogênica em massa, criada por meio de estresse crônico e transmitida psicologicamente, uma espécie de histeria em massa. Nesta teoria, tudo era psicossomático, causado pelo fator de dispersão. Literalmente: uma pessoa ria incontrolavelmente, outra acompanhava e logo, todos estavam rindo, sem entender ou saber porque. O estudo dessa epidemia fez com que a comunidade médica e psiquiátrica nomeasse essa condição de Doença Psicogênica de Massa (MPI). Ela é psicogênica, o que significa que está tudo na mente das pessoas que apresentaram os sintomas manifestados. Ela não seria causada por um elemento no ambiente, como intoxicação alimentar ou uma toxina dispersa no ar. O fator central seria o estresse compartilhado pela população. É um tipo de histeria, associado mais frequentemente a mulheres, mas que pode atingir qualquer grupo de indivíduos vivendo em sociedade.
Outra ideia é que a epidemia foi causada por algum tipo de vírus que atingia certas áreas do cérebro. Silvia Cardoso, bióloga comportamental da Universidade Estadual de Campinas, no Brasil, acredita que a epidemia do riso foi causada por um vírus semelhante à encefalite que danificou estruturas na parte basal do cérebro causando crises de riso. Ela defende que é pouco provável que uma reação de massa puramente psicológica durasse tanto tempo e fosse tão difundida. No entanto, nenhum sinal de vírus ou qualquer tipo de toxina foi encontrado nas vítimas.
Finalmente, na ausência de uma explicação científica para a Epidemia, muitos recorreram ao mundo paranormal. Dizia-se que a epidemia era causada por espíritos que estavam insatisfeitos com a forma como a sociedade tanzaniana se afastava de suas antigas tradições, adotando os costumes do ocidente. Para curar a condição, alguns médicos naturais e feiticeiros tribais recorriam a velhas receitas com exorcismo, danças e aplicação de remédios naturais. Por se tratar, em teoria, de uma doença de fundo emocional, por vezes isso trazia efeitos benéficos e fazia cessar os sintomas. Na superstição local, isso significava que o espírito havia sido afastado.
Até hoje a misteriosa Epidemia do Riso de Tanzânia jamais foi explicada, e continua sendo um incidente isolado e inexplicável, sobretudo por ter se espalhado por tantas pessoas e por tanto tempo. Não se sabe se tal coisa foi um fenômeno isolado ou se poderá vir a se manifestar uma vez mais.
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