domingo, 12 de maio de 2019

La Lhorona - As origens da Lenda sobre a Mãe que Lamenta pelos seus filhos


"E onde quer que o povo mexicano vá, ele leva consigo a lenda, a Lenda da Llhorona, a mulher que lamenta. E para onde a lenda é carregada, ela segue. Mesmo hoje, ela está aqui. Nós ouvimos o seu choro à noite, perto do rio. Muitos a viram andando por estas mesmas ruas. E ela sempre chora, e nosso povo sofre. Talvez, quando o rio se encher de lágrimas ela vá embora. Mas é fato que ela só partirá quando estiver pronta. Até lá, não podemos fazer nada além de rezar. Rezar e evitar o rio depois do anoitecer" 

A Lenda da Llorona
- O Mito do México

Uma mexicana, Juana Léija, tentou matar seus sete filhos jogando-os nas águas da Baía de Buffalo, em Houston, Texas, em 1986. Vítima frequente de violência doméstica, ela aparentemente estava tentando acabar com o sofrimento dela e de seus filhos, dois dos quais não sobreviveram. Durante uma entrevista, Léija declarou que ela era La Llorona (A Chorona).

La Llorona é uma figura lendária com várias encarnações presente na mitologia Mexicana. Geralmente traduzida para o inglês como Weeping Lady ("a mulher que chora"), ela é frequentemente apresentada como um tipo de fantasma ou banshee: uma aparição de uma mulher vestida de branco, encontrada próxima de lagos ou rios, às vezes em encruzilhada, que chora durante a noite por seus filhos perdidos, a quem ela própria matou. O infanticídio às vezes é realizado com uma faca ou adaga, mas na maioria das vezes as crianças são vítimas de afogamento. Seu terrível crime geralmente é cometido em um ataque de loucura depois de ter descoberto sobre um amante infiel ou marido que a deixou para se casar com uma mulher de status mais elevado ou riqueza. Depois de perceber o que ela própria fez em um ato de desatino, ela geralmente comete suicídio. A Chorona é frequentemente descrita como uma alma perdida, condenada a vagar pela terra para sempre. Para alguns, ela é um bicho-papão, usado pelos pais para assustar as crianças que não se comportam.

Mas o que quer a Llhorona? Em geral, as histórias concordam que ela é um espírito vingativo e ensandecido. Seu pecado, motivado pela rejeição a levou ao desespero e ao ato de matar suas crianças - crime que as mães não podem suportar. Seu crime, a faz continuar existindo apesar de morta, vagando sem destino: louca e entristecida. Crianças são o seu alvo, ela não suporta ver crianças vivas enquanto as suas não mais estão. Ela as afoga como vingança, ou como marca de sua loucura.


Esta história folclórica tem sido representada artisticamente em várias formas: no cinema, na animação, na arte, na poesia, no teatro e na literatura, tanto para adultos como para crianças. A lenda está profundamente enraizada na cultura mexicana e entre a população mexicana residente nos Estados Unidos.

As origens da lenda são incertas, mas foi apresentada como tendo raízes pré-hispânicas. Acredita-se que La Llorona seja um dos dez presságios que predizem a Conquista do México e também esteja ligada à Deusas Astecas. No Códice Florentino, uma obra enciclopédica sobre os povos nahuas do México, concluída no século XVI pelo frade franciscano Bernardino de Sahagún, encontramos duas deusas astecas ligadas a La Llorona. A primeira é Ciuacoatl (mulher-cobra), descrita como "uma besta selvagem e um mau presságio" que "aparecia de branco" e que andava à noite "chorando e lamentando". Ela também é descrita como o "presságio de guerra". Essa Deusa também poderia estar ligada ao sexto de dez presságios que estão registrados no códice como tendo predito a Conquista: "a voz de uma mulher será ouvida lamentando à noite, chorando sobre o destino de seus filhos. E de todos que morreram e ainda irão morrer, vítimas da derrota".

Um códice posterior do frade dominicano, Diego Durán, detalha os mitos de origem dos deuses astecas e discute a deusa Coatlicue, que é frequentemente ligada a Ciuacoatl. Coatlicue era a mãe de Huitzilopochtli, o Deus Asteca da guerra. Durán a descreve como "a mulher mais feia e suja que se poderia imaginar". Seu rosto tão negro e coberto de sujeira que parecia algo saído do inferno”. Ela espera que seu filho volte para ela da guerra e chora e lamenta por ele enquanto ele está fora. Durán também fornece detalhes de algumas ocorrências estranhas antes da conquista que supostamente teriam perturbado o Rei Montezuma. Entre os presságios estaria o de uma "mulher que vagueia pelas ruas chorando e gemendo pelos filhos mortos".

Embora esses relatos preencham alguns elementos da lenda de La Llorona, há uma outra deusa ligada a água e infanticídio, elementos contidos na lenda. De acordo com o Códice Florentino, Chalchiuhtlicue era a deusa das águas e a irmã mais velha do deus da chuva, Tlaloc. Ela é descria como alguém a ser "temido" e que "causou grande terror". Dizia-se que ela afogava as pessoas e afundava barcos. Cerimônias em honra dos deuses da chuva, incluindo Chalchiuhtlicue, envolviam o sacrifício de crianças que eram mortas em piscinas, novamente, afogadas. Essas vítimas sacrificiais foram compradas de suas mães e quanto mais as crianças choravam, mais bem-sucedido era o sacrifício aos olhos dos sacerdotes.


La Llorona também foi confundida com La Malinche, tradutora e concubina do Conquistador Hernam Cortés. Como tal, ela é muitas vezes retratada como uma mulher indígena abandonada pelo amante espanhol. No entanto, há muitos temas europeus e do mundo antigo semelhantes aos quais ela também poderia estar ligada: a "Mulher Branca" da tradição germânica e eslava, a Lorelei e, é claro, a Banshee irlandesa. A lenda da mulher que mata seus filhos depois de ser traído por seu amante e descartada por uma mulher de maior status ou raça mais "apropriada" também tem raízes na tradição grega, na lenda de Medéia e Jasão.

É estranho que um mito tão difundido possa ter características tão diferentes, e ainda assim, ser conhecido pelo mesmo nome. De fato, as variações na história folclórica parecem ser geográficas, com diferentes regiões tendo suas próprias versões ligeiramente diferentes da mulher que lamentava. 

Além disso, a lenda mudou ao longo do tempo, aparentemente para refletir condições da sociedade mexicana. Há diferentes versões para a origem da lenda.

La Llorona, uma peça de 1917 de Francisco C. Neve é ​​ambientada durante o reinado de Filipe II (1556-98). A protagonista é Luisa. Ela tem um filho com seu amante, Ramiro, filho de Cortés, que tem um status social muito maior. Embora eles estejam juntos há seis anos, Ramiro deve se casar com a filha rica de um juiz. Luisa não tem conhecimento disso e Ramiro acredita que ele pode continuar seu relacionamento com ela, se ele se casar em segredo. Luisa é informada sobre o casamento de Ramiro e levada à loucura, não apenas pela infidelidade de Ramiro e sua decisão de se casar com alguém por honra e status, mas por seu desejo de levar seu filho para longe dela. Quando ele vem buscar seu filho, Luisa o mata com um punhal, oferecendo a Ramiro seu corpo em um delírio, dizendo que ela o matou depois que Ramiro matou sua alma. Luisa é enforcada por seu crime em uma execução pública durante a qual ela é tratada como bruxa. Ramiro morre de tristeza quando o fantasma de Luisa, transformado na Llorona, aparece para assombrá-lo.


A história parece refletir a vida no México colonial. Embora inicialmente houvesse uma escassez de mulheres espanholas na Nova Espanha, o que significava que a união entre mulheres indígenas e homens espanhóis eram bastante comuns, no final do século 16 a população de mulheres européias aumentou enquanto o status de mulheres locais caía. 

Os destinos dessas mulheres indígenas e mestiças variavam. Algumas desfrutavam de estabilidade e e, portanto, se beneficiavam dessas uniões, mas na maioria das vezes elas foram deixados de lado depois de alguns anos para mulheres mais jovens ou, mais freqüentemente, uma esposa espanhola. De forma mais alarmante, as crianças resultantes do enlace eram às vezes tiradas de suas mães indígenas ou mestiças em uma prática derivada de uma tradição espanhola de punir as chamadas mulheres "rebeldes" de seus filhos. Situação que resultava em mulheres levadas ao desespero em face da separação compulsória. Elas preferiam ver os filhos mortos a viver sem eles.

Em outra versão da lenda, datada de 1933 a história de La Llorona, enfatiza a diferença de classe. O roteiro é ambientado na década de 1930 e o foco é sobre os descendentes de Cortés, que se mostram amaldiçoados pela deusa da morte durante a Conquista. La Llorona manipula a protagonista principal, Margot, e a faz matar seu filho, quando ela descobre que seu amante, o pai do menino, deve se casar com uma mulher rica. Como a peça de 1917, a protagonista é levada a loucura pelo pensamento de que seu amante pode tentar levar seu filho. Após matar a criança afogada, Margot, ela própria acaba se tornando um fantasma similar a Lhorona. 


Versões posteriores da história da mulher chorosa apresentam o vilão como espanhol e criam heróis nas culturas mestiça e indígena. A peça de Carmen Toscano de 1959, La Llorona, por exemplo, apresenta uma dura crítica à Conquista e ao período colonial, com especial atenção para o tratamento dos povos indígenas pelos conquistadores espanhóis. A Conquista espiritual também é apresentada como bastante caótica e, no geral, a Nova Espanha é mostrada como um lugar de caos, morte e injustiça. A protagonista é Luisa, uma mestiça, e seu amante, Nuño, é um conquistador espanhol que se casa com Ana, uma rica dama espanhola em segredo, planejando então retornar à Espanha. Ele não parece se importar com Luisa e nem está particularmente interessado em seus filhos. Luisa os esfaqueia até a morte e joga seus corpos no canal. Depois disso, Luisa é julgada e enforcada na praça principal da cidade. Ela chora por seus filhos e acaba se erguendo dos mortos como um fantasma para se vingar de Nuño.

Anualmente peças de La Llorona são apresentadas no Lago Xochimilco, na Cidade do México, local de importância para a lenda que é parte da identidade mexicana. "Nossa nação nasceu das lágrimas de La Llorona." O calendário da peça persiste por duas semanas no final de outubro e início de novembro, sobrepondo-se ao Dia dos Mortos. A celebração tem sido realizada há mais de 20 anos.

Embora em essência o Dia dos Mortos do México seja uma versão das festas católicas romanas Dia de Todos os Santos, o festival, comemorado em 1 e 2 de novembro, tem origens contestadas. É considerado por alguns como uma tradição indígena apropriada pelos colonizadores e por outros como uma prática colonial". No entanto, as tradições familiares do Dia dos Mortos - decorar sepulturas e construir altares em casas dedicadas a membros falecidos da família - são bastante diferentes das exuberantes festividades exibidas nos centros das cidades para os turistas desfrutarem. Nos últimos anos, o Dia dos Mortos passou a ser visto pelos estrangeiros como o festival mexicano por excelência e se tornou uma atração turística famosa.

As evidências sugerem que La Llorona, como ela é agora conhecida, é um mito que evoluiu ao longo do tempo e tem sido usado desde o final do século XIX para refletir e comentar a sociedade do México e sua história.

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