quarta-feira, 19 de maio de 2021

Gigantes Impuros - A Conclusão da anatomia dos Gug

Continuando o artigo a respeito dos Gug.

Em raríssimas ocasiões um Gug pode chegar ao Mundo Desperto através de túneis, portais ou passagens dimensionais abertas por feiticeiros ou outros exploradores oníricos capazes de tal coisa. Alguns bruxos acreditavam ser possível domesticar ou transformar essas criaturas em seus servos, mas até onde se sabe tal plano se mostrou inviável e muitos destes feiticeiros terminaram seus dias nas garras de um destes monstros.

Para todos efeitos, Gug são seres indomáveis e não obedecem ordens, o que os tornam péssimos serviçais. Nem é preciso dizer que manter tais criaturas sob controle constitui um grande desafio. Ademais o Gug é uma ameaça para qualquer forma de vida que tenha o azar de ficar ao alcance de seus braços. Essas criaturas não são afeitas à realidade desperta, encontrando uma série de dificuldades no processo de adaptação. É possível que os problemas tenham relação com seu tamanho descomunal e o nível de oxigenação no sangue da criatura. Fica evidente que os Gug transladados das Terras do Sonho para o mundo real sofrem com essa mudança. Na maioria das vezes eles acabam morrendo em poucas semanas. 

Uma vez que não pertencem ao nosso mundo, o material de seus corpos, carne, músculos e ossos, deterioram rapidamente após o cessar das funções vitais, até se desfazerem por inteiro, sem deixar nenhum sinal de sua existência. É possível, contudo, que existam métodos mágicos para preservar um Gug em nossa realidade, ainda que estes sejam complexos.

Ao longo da história, registram-se narrativas a respeito da presença dessas criaturas em nosso mundo. Uma das mais antigas narrativas dá conta de que uma Legião Romana estacionada na Gália no século primeiro, enfrentou uma criatura cuja descrição se assemelha muito a de um Gug. O monstro foi morto pelos legionários, depois destes sofrerem pesadas baixas. O cronista da tropa, Caducius, escreveu a respeito do incidente e este relato sobreviveu ao tempo.


Na África, no Império do Mali (no ano 1300 dC), guerreiros da dinastia Manden Kurufaba contam lendas sobre o enfrentamento de uma criatura fabulosa, um gigante com a descrição condizente de um Gug. O monstro foi invocado por feiticeiros inimigos do Grande Rei que planejavam derrubá-lo do poder. A criatura foi morta por guerreiros. O incidente mais conhecido e amplamente registrado data da Civilização Khmer (em 1460 dC, no atual Camboja) que possui documentos que não apenas descrevem, mas incluem desenhos de vários Gug enfrentando guerreiros.

Mais recentemente casos envolvendo o mítico Pé Grande ou o Yeti podem estar de alguma forma relacionado ao avistamento de um Gug desgarrado. O mesmo pode ser verdade a respeito dos lendários trolls dos povos nórdicos. O assustador Grendel, o demônio da famosa saga de Beowolf pode muito bem ser inspirado por um Gug. Em outras partes do mundo, há seres folclóricos que guardam alguma semelhança com a descrição das criaturas. O Mapinguari, aberração presente no folclore das tribos tupi-guarani da Amazônia, parece ter sua origem ligada a tais seres.

Fisicamente os Gug são humanoides, com um corpo ereto que se divide em cabeça, tronco e membros. Sua aparência geral, é tão assombrosa quanto abominável para os humanos que os veem pela primeira vez. A presença de um Gug não apenas é intimidante, como ameaçadora. O primeiro ponto é que eles são Gigantes, com o adulto macho tendo em média 14 metros de altura distribuídos em um corpo musculoso e longilíneo pesando mais de duas toneladas. Os Chefes de Caça podem ser ainda maiores, com espécimes atingindo 18 metros. Já as fêmeas são um pouco menores, com as mais altas não passando dos 12 metros de altura.


Os Gug possuem um tórax amplo, pernas compridas e braços que se dividem na altura do cotovelo para gerar dois antebraços cada, com suas respectivas mãos. Eles possuem pés e mãos com quatro dedos e polegares opositores similares aos dos símios que lhes permitem manipulação. As mãos são fortes e ágeis, adaptadas para escalar e agarrar, embora as unhas não sejam especialmente afiadas. Os Gug tem o corpo inteiro coberto de cabelos espessos e crespos, quase sempre pretos e muito escuros. Ambos os gêneros tem uma concentração maior de cabelos no tórax, genitais, braços e pernas que protegem essas áreas como uma defesa natural. Os fios emaranhados similares a arame chegam a 3 centímetros de diâmetro e podem ter vários metros de comprimento. Eles são cobertos por um sebo de odor nauseante produzido pela criatura.

Apesar de seu tamanho descomunal, os Gug conseguem ser furtivos, principalmente quando estão caçando. Eles são capazes de se esgueirar e atacar suas presas de surpresa ou empreender perseguição em alta velocidade. A brutalidade desses monstros também é digna de nota, os Gug usam as mãos para arrancar membros e os pés para esmagar os oponentes. Quando furiosos, apenas a destruição completa do inimigo pode diminuir seu ímpeto assassino. Um único gigante pode devastar um exército e não por acaso, esses monstros são muito temidos em toda Terra dos Sonhos. Mesmo os ghasts, que são seus inimigos naturais, ousam enfrentá-los apenas quando se encontram em vantagem numérica. Enfrentamentos entre os Gug e Ghasts tendem a ser frequentes e especialmente mortais.

A característica mais bizarra dos Gug diz respeito ao seu rosto. A face da criatura é dividida por um longo rasgo que se abre para revelar uma boca vertical estendendo-se do que seria a testa até o queixo. Essa boca é guarnecida de grandes presas amareladas que podem destroçar uma vítima com facilidade. A força da mandíbula, equiparada a uma prensa hidráulica, é tamanha, que consegue facilmente dividir um homem adulto num único movimento. A mordida é uma de suas armas principais e um Gug tende a morder e devorar vorazmente o que consegue agarrar.


A língua do monstro é relativamente curta, usada para empurrar os alimentos garganta abaixo. Seu pescoço musculoso se dilata para permitir a passagem do alimentos pela goela. Os pequenos olhos rosados do gug, destituídos de íris, se posicionam um de cada lado da cabeça. Os gigantes enxergam perfeitamente na escuridão dos subterrâneos, mas seus olhos não são muito úteis na claridade. Eles se incomodam com fontes luminosas, ainda que não sejam cegados por elas. Seu sentido mais desenvolvido, sem dúvida, é o olfato. Eles são capazes de farejar alimentos à uma distância de 500 metros, localizando presas em potencial antes mesmo de vê-las. Exploradores dos subterrâneos são alertados a jamais levar consigo comidas que exalem cheiro, pois isso atrai os Gug. 

A face do Gug é bastante maleável e usada para transmitir estados de ânimo entre si. Essa forma de comunicação rudimentar é limitada a simples conceitos emocionais como raiva, medo e curiosidade. Não se sabe se eles são capazes de aprender outros idiomas ou entender o básico de outras línguas. Uma vez que não falam, os Gug se mostram curiosos a respeito da voz de outros seres, em especial quando estes gritam. Há relatos de gigantes que mantém prisioneiros, ao menos enquanto dura sua curiosidade a respeito das pequenas criaturas capturadas. 

Esses habitantes dos subterrâneos não são muito espertos e uma criatura apenas um pouco mais inteligente é perfeitamente capaz de ludibriar os monstros. Entretanto, o verdadeiro perigo é que os Gug se irritam e tendem a descontar suas frustrações nos frágeis seres à sua volta. Por exemplo, um Gug pode ser levado a acreditar que uma presa está morta e ignorá-la se esta não se mover. Contudo, se ele perceber uma tentativa de fuga, pode simplesmente arrancar as pernas ou esmagar a cabeça da pessoa para que ela não tente novamente. O Gug não possui qualquer senso de moral ao tratar com seres menores que eles. Para todos efeitos humanos são meramente alimento ou uma fonte de curiosidade transitória. 

Gigantescas e brutais, essas criaturas representam um grande perigo a todos aqueles que exploram as sendas oníricas. Nunca é demais alertar esses aventureiros de que os recessos subterrâneos e as câmaras intocadas pela luz por vezes podem ser o covil de horrores inimagináveis. Assim como, algo ainda pior: o covil de um Gug.
Os Gug surgiram através da mente criativa de H.P. Lovecraft, aparecendo pela primeira vez na novela "A Busca Onírica de Kadath" (The Dream Quest of Unknown Kadath). A história foi escrita entre 1926 e 1927 e não chegou a ser revisada ou publicada enquanto o autor estava vivo. 

Ela é ao mesmo tempo a mais longa história escrita no chamado Ciclo dos Sonhos e a mais longa da carreira de Lovecraft. "Dream Quest" combina elementos de fantasia e horror, se passando inteiramente numa realidade acessada através de sonhos. Ela é estrelada pelo "alter-ego" de Lovecraft, o acadêmico/aventureiro Randolph Carter que também protagoniza outras histórias.

A novela foi publicada postumamente em 1943 e hoje é considerada como um dos projetos mais ambiciosos de Lovecraft.

Os Gug se tornaram monstros bastante populares entre os fãs, criaturas que figuram em histórias escritas por outros autores, em games e principalmente em RPG. Eles estão presentes no bestiário de diferentes mundos de fantasia, sempre como criaturas extremamente temidas.   

3 comentários:

  1. Apavorante! Que monstro bizarro e literalmente grotesco!
    As descrições dos monstros que você publica nos seus artigos "Anatomia dos XXXX" vem dos bestiários de Call of Cthulhu ou são da sua imaginação com base no que você leu do Mythos e já jogou nos RPG?

    https://bardodanevoa.blogspot.com/

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  2. Olá Bardo da Névoa,

    São de fato uma mistura. Eu pego como base o que se sabe a respeito da criatura, mas em meio ao texto vou acrescentando coisas que imagino encaixam na história.

    Considero isso uma pequena contribuição para aumentar o lore a respeito dos monstros, sobretudo porque esse é um dos propósitos do Círculo Lovecraftiano.

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  3. Desculpe a pergunta fora de contexto, mas como posso me tornar um colaborador para o site.

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