"O Enigma do Outro Mundo" de John Carpenter é um dos meus filmes de horror/ficção favoritos como muitos já devem ter percebido a partir da resenha anterior. Eu gosto do conto "Who Goes There?" (publicado na coletânea Artactos Cycle da Chaosium), a estória original de John W. Campbell que deu origem a esse filme e todas as suas encarnações prévias. Embora o primeiro filme, cujo título era "O Monstro do Ártico" não tenha me impressionado muito, sobretudo por ser um tanto datado (ele foi feito em 1951!), não deixa de ser divertido.
Por essa razão talvez eu tenha assistido "A Coisa" com um misto de ansiedade e desconfiança. Ansiedade porque há anos circulam boatos que uma continuação seria lançada e desconfiança pois seria compreensivelmente difícil um filme chegar aos pés do original. O pensamento que passava pela minha cabeça era: "Não parece ser uma boa idéia".
A despeito disso, eu estava preparado para dar uma chance a versão assinada pelo diretor holandês Matthijs van Heijningen. Uma das coisas que chamou a atenção foi a proposta da produção: centrar em eventos anteriores aos mostrados no fime original. Não se trata portanto de uma sequência, mas de uma prequel.
Quem assistiu "O Enigma do Outro Mundo" se recorda que a criatura alienígena enterrada no gelo não foi encontrada pela equipe norte-americana e sim por um grupo de noruegueses. Tudo o que sabíamos a respeito da equipe nórdica é que eles desenterraram a coisa, a enfrentaram e acabaram massacrados pelo monstro.
A Coisa (2011) se concentra nesses acontecimentos: revela os detalhes sobre a descoberta da imensa nave espacial e de seu perigoso passageiro. Conta como a criatura se libertou da sua prisão de gelo e o caos que se espalha pelo campo quando o monstro começa a fazer vítimas. De certa maneira não chega a ser um problema saber de ante-mão como termina o filme. Todos já sabem que mais da metade do elenco está ali simplesmente para servir de bucha de canhão e ser exterminado sem dó nem piedade pela criatura.
É impossível fazer uma resenha desse novo "A Coisa" (2011), sem estabelecer um paralelo com seu predecessor de 1982. Ao meu ver a grande diferença entre os dois é o tom adotado pelo roteiro de cada um. "Enigma" é um filme que explora ao máximo a paranóia e a degradação das relações de um grupo aterrorizado pela presença de uma entidade estranha em seu meio. O horror é causado, sobretudo pelo fato de que qualquer um deles pode ser a criatura disfarçada.
"A Coisa" está mais inclinado a ser um filme de ação, a criatura não está interessada em se esconder e colocar os humanos uns contra os outros. Ela toma a iniciativa e parte para o confronto disposta simplesmente a eliminar os cientistas - de preferência da maneira mais sanguinária possível. Não é de maneira alguma algo que desmereça o filme, mas sob essa ótica há menos espaço para reviravoltas.
É um tanto difícil estabelecer um grau de empatia com os personagens da estação norueguesa. Todos eles são bastante parecidos tanto na aparência quanto na motivação, os caras simplesmente não tem tempo de serem apresentados. Quando a Coisa aparece eles morrem sem que ninguém se importe com seus nomes ou o que faziam ali.
A surpresa é que o roteiro elege uma protagonista do sexo feminino como a principal antagoniosta do monstro. A paleontologista Kate Lloyd (Mary Elizabeth Winstead) é recrutada por um renomado cientista para realizar o procedimento de remoção de uma forma de vida alienígena presa no gelo. É uma escolha estranha de protagonista, visto que o filme original não tinha nenhuma personagem feminina e o herói era um cara casca-grossa como Kurt Russel.
Kate parece um eco da personagem Ripley interpretado por Sigourney Weaver, sobretudo no que diz respeito ao primeiro filme da série Alien. As duas são mulheres em posição de comando, cuja autoridade não é respeitada pelos demais companheiros. Apenas quando suas teorias à respeito da criatura se provam verdadeiras é que os outros a percebem. Mas enquanto Ripley crescia no decorrer do filme a personagem de Winsted continua sem brilho. Mesmo quando ela entra em ação com lança chamas em punho, a personagem não convence. Parece forçado uma mocinha até então frágil e tímida de repente adquirir toda aquela coragem.
Uma falha no meu entender, mais séria, é que o filme é estruturado em cima de situações de susto, enfatizadas por um repentino aumento do volume de som. Algo que se tornou lugar comum em nove entre dez filmes atuais de horror. O monstro aparece, ataca e some e o gato e rato se repete ao longo de toda projeção com humanos e alienígena se alternando nos papéis.
Saturado por cenas desse tipo, o suspense acaba diluído em algumas sequências que não causam o choque ou a surpresa almejada. Não há cenas de tensão memoráveis como no primeiro filme e a morte dos personagens (sendo noruegueses, os de barba e americanos, os sem barba) passam a ser apenas uma consequência dos acontecimentos, pouco ou nada relevante para o espectador.
Se há um acerto nesse filme é que "A Coisa" presta uma espécie de tributo ao filme original com pequenos detalhes que vão sem dúvida colocar um sorriso de cumplicidade no rosto dos fãs do filme original. Aliás, eu aconselho quem viu Enigma do Outro Mundo, que o assisita novamente antes de ver "A Coisa" -- dá para encontrá-lo até no Netflix!
A experiência de achar detalhes em comum entre os dois filmes é gratificante. Pessoalmente eu teria terminado o filme de outra forma, mais condizente com o clima de desespero nihilista do original, mas não me queixo do resultado final. Ouvir a trilha sonora de Ennio Morricone (adaptada por Marco Beltrami) já vale metade do ingresso.
Outro ponto favorável ao filme, é que "A Coisa" continua sendo um vilão muito interessante. Totalmente criada através de efeitos digitais pela dupla Stan Winston e Rob Botin (dois craques remanescentes do filme original), a Coisa continua bizarra. Uma aberração alienígena destituída de uma aparência dominante, capaz de se tornar qualquer pessoa é por si só uma noção perturbadora. Quando a transformação acontece e a forma se desmancha em um emaranhado de tentáculos é impossível não se impressionar. E quando o monstro elimina o noruguês barbado #9, você chega até a sentir uma simpatia pelo monstrengo. Ele afinal de contas é o personagem central na trama. Não há como discutir isso.
Com tudo isso dito, vamos ao veredito: "A Coisa" é um ótimo entretenimento. Fica longe de ser uma obra de arte, mas está num patamar elevado, bem acima das produções habituais. Além disso, não joga lama em cima do filme original, pelo contrário, presta uma indisarçável homenagem a ele. John Carpenter quando perguntado à respeito desse filme, disse ter ficado satisfeito com a prequel.
É o tipo do filme para reunir os amigos, entornar umas cervejas e detonar pipoca. Para quem for assistir nesse espírito vai se divertir, embora não vá lembrar dele por muito tempo.
COTAÇÃO:
TRAILER:
Sempre tenho a sorte de pegar boas resenhas aqui no Mundo Tentacular. Essa também está excelente.
ResponderExcluirMeus parabéns!
Quem quiser ver um pouco mais sobre A Coisa e uma adaptação para o RPG GURPS, pode dar uma conferida em: http://viladorpg.wordpress.com/2012/03/15/the-thing-adaptacao-para-gurps/
Um filme divertido. Vale a pena assistir. Como dito acima, não é um clássico, mas apresenta alguns detalhes interessantes.
ResponderExcluirPerceber as "interfaces" com o filme do Carpenter resulta em um sorriso de canto de boca. A melhor parte.
Mamedes
Filme bem ruim, o antigo com kurt russel bem superior a este remake (podre).
ResponderExcluirCaras, talvez vocês já tenham visto esse curta e é impossivel não ligar aos Mythos.
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=vWsnjOQIeaY
Fica a dica pra ver e comentar
O filme facaria bem melhor se usassem os animatronics que estavam planejando.
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?v=JchXCnuQFrs