"Estabelecemos um acampamento provisório na borda do Deserto de Pedirka. Nosso objetivo era acampar num vilarejo aborígene com os quais nosso guia já havia tratado anteriormente, mas não foi possível... havíamos retornado da escavação, trazendo conosco alguns artefatos que encontramos em uma caverna: pedras pintadas, pedaços de silex e algumas cabaças, além de três pequenas peças de pedra com figuras peculiares rudemente esculpidas por mãos humanas. Grotesco é bem verdade, mas as peças demonstravam inegável habilidade da parte de quem as entalhou. Ocorre que um dos rapazes, Whitford, o graduando, decidiu mostrar as peças a alguns dos nativos, talvez para saber do que se tratava... no momento que o fez, os nativos, até então amistosos se acabrunharam de tal forma, que tememos pela nossa segurança. Nosso intérprete, não deu conta de traduzir tudo o que eles disseram, mas ficou claro que qualquer pedido para pernoitar no vilarejo seria negado. De fato, eles praticamente nos expulsaram do lugar... Uma lástima! Achamos por bem concordar e partir o quanto antes. Passamos a tarde montando o acampamento, tivemos de nos afastar do povoado alguns bons quilômetros, pois eles não permitiram sequer que montássemos nossas barracas nos arredores. Após uma busca, achamos um bom local para passar a noite, amanhã tentaremos falar com os nativos uma vez mais e apaziguar os animos... Espero que tenhamos uma noite tranquila".
Última anotação no diário de Thomas Kendal, chefe arqueólogo da Expedição Miskatonic a Austrália, Deserto de Pedirka, 1935.
* * *
Em nosso planeta, não faltam lugares inóspitos, desolados e abandonados. Cantões remotos onde a vida parece insustentável; cobertos de pedras, varrido pela areia e poeira. Tais lugares mais se assemelham a paisagens alienígenas do que recantos erigidos pela natureza. Neles, tudo parece conspirar contra a vida humana - as bruscas variações de temperatura, os ventos inclementes, a vegetação venenosa e os animais peçonhentos.
Em alguns desertos incrivelmente agrestes, onde humanos falharam em se estabelecer, vagam outros seres; criaturas que não são nativas de nosso mundo, mas que encontraram nesses ermos desolados um habitat no qual prosperam à despeito das dificuldades.
Tomemos por exemplo os assim chamados Habitantes do Deserto, uma espécie misteriosa, estranha ao gênero humano que não pode (e nem deve) ser confundida com qualquer raça nativa desse planeta. Aqueles que tiveram contato com essas criaturas as tratam como um gênero totalmente diverso e não estão errados em assumir que sua presença em nosso planeta decorre de algum acidente que aqui os lançou, deixando-os como náufragos em uma terra estranha.
Os Habitantes do Deserto são oriundos de outra dimensão. Não se sabe ao certo de que forma os primeiros seres dessa raça desembarcaram em nosso planeta, mas sabe-se que aqui ficaram permanentemente ilhados, incapazes de retornar ao seu ponto de origem. Postula-se em alguns tratados esotéricos, que os primeiros deles teriam sido trazidos por entidades planares que romperam o tecido de nossa dimensão e aqui se estabeleceram milênios atrás. Eles formariam uma espécie de comitiva, sendo mais provavelmente serviçais ou mesmo escravos destas entidades superiores. Reforça essa teoria o fato de que a arte pertencente a esses seres, desenhos rupestres e grotescos entalhes em pedra, quase em sua totalidade se referem a figuras divinas tratadas com inegável veneração, idolatria e evidente terror.
Outros estudiosos dos Mitos Antigos assumem que os Habitantes do Deserto podem ter dominado algum tipo de conhecimento místico que lhes permitiu construir passagens dimensionais conectando seu mundo com o nosso. Se essa teoria for verdadeira, é quase certo que a raça sofreu algum tipo de degeneração, revertendo a um estágio no qual perdeu seu conhecimento, deixando de serem capazes de acessar, quanto mais construir tais portais dimensionais.
Seja lá como se deu o surgimento dos Habitantes do Deserto em nosso mundo, é fato que eles passaram a viver em regiões remotas e afastadas de qualquer assentamento humano. Os Habitantes do Deserto, como diz o próprio nome, preferem residir em regiões estéreis formadas por vastas extensões de terra árida evitada pelos seres humanos. Eles não precisam de muitos recursos para sobreviver, e sua necessidade de água e alimentos parece ser mínima. Não há muitas informações que expliquem como eles conseguem perdurar nas mais árduas regiões, mas o segredo de sua sobrevivência parece estar ligado a sua fisiologia alienígena.
Embora alguns deles sejam por definição nômades, os Habitantes do Deserto tendem a buscar cavernas e estruturas rochosas onde encontram refúgio. Essas cavernas calcárias passam a ser moradias sazonais, usadas de acordo com a necessidade. Complexos mais profundos podem ser usados como habitações de caráter definitivo, reunindo algumas centenas de indivíduos, mas tais comunidades são bastante raras. Os Habitantes do Deserto preferem viver em pequenos bandos de caçadores e coletores onde cada um tem um papel bem definido. Os indivíduos mais fortes são os líderes naturais e comandam todos os demais intimidando e coagindo seus subalternos. Violência é uma constante entre essas criaturas e a sobrevivência dita todas as iniciativas e atitudes. Cada bando possui apenas uma fêmea que pertence exclusivamente ao líder.
As fêmeas são muito raras entre os Habitantes do Deserto, nascendo apenas uma a cada dez crias. Seu papel é crucial, existem apenas para reproduzir com o indivíduo mais forte e gerar novos membros para o bando. Quando uma fêmea surge ou é raptada de outro bando, ela é protegida como um verdadeiro tesouro, uma vez que deverá substituir a matriarca tão logo atinja a maturidade. O fato das fêmeas serem tão raras certamente é a razão pela qual a população de Habitantes do Deserto permanece pequena.
Os membros de um mesmo bando possuem um elo telepático que embora limitado permite que compartilhem seus pensamentos e "conversem" entre si sem articular sons. Usando essa mesma capacidade, eles são capazes de impor sua vontade sobre animais, transformando serpentes, escorpiões, morcegos e outras criaturas do deserto em seus agentes e espiões. Há rumores de que alguns humanos são suscetíveis a essa telepatia e portanto capazes de compreender o "idioma" dos Habitantes do Deserto. Esse contato telepático, se duradouro, desencadeia um efeito colateral que afeta a capacidade cognitiva na mente humana, tornando o indivíduo gradualmente incapaz de raciocinar de forma coerente. Por essa razão, pessoas capturadas e mantidas por muito tempo na companhia de Habitantes do Deserto acabam enloquecendo e são incapazes de explicar o que aconteceu.
De hábitos noturnos, eles preferem permanecer na porção mais profunda de seus covis ao longo do dia. Quando a noite cai, os Habitantes deixam o esconderijo e vagam por uma determinada extensão territorial em uma patrulha de quatro ou cinco indivíduos adultos que busca alimento e visa estabelecer a segurança do perímetro. Eles enxergam perfeitamente no escuro e conseguem captar sons e cheiros com enorme precisão. Os Habitantes preferem agir furtivamente se mesclando com o ambiente de tal forma que é quase impossível detectar sua presença. Silenciosos, eles observam invasores e presas em potencial, aguardando o melhor momento de atacar, de preferência quando estes estão sozinhos. O ataque tende a ser rápido e brutal, a presa é dominada e morta, em seguida arrastada para o covil para ser devorada. Essas criaturas raramente usam ferramentas, preferindo se valer de garras e presas afiadas. Por vezes, eles podem ter facas de pedra, clavas ou ossos, mas não é comum vê-los portando tais objetos o que contribui para a presunção de que são seres primitivos. O ato de consumir suas vítimas é puramente ritualístico já que eles quase não tem necessidades nutricionais. Os Habitantes podem viver por meses com rações ínfimas de alimento e quantidades irrisórias de água.
Fisicamente essas criaturas atingem no máximo 1,60 de altura, e costumam andar em uma postura arqueada para frente com os braços dobrados na altura no peito. Eles são bastante esguios quase ao ponto de serem emaciados, com braços e pernas longelíneos e discretamente mais longos do que o normal. Não há vestígio de gordura em seus corpos, e sua pele amarelada ou num tom de areia se estica sobre os músculos e tendões como couro curtido conferindo-lhes uma aparência mumificada. Eles costumam cobrir a pele com camadas de areia que lhes concede uma eficaz camuflagem em seu ambiente natural. Não usam roupas ou adornos, embora o líder do bando e sua fêmea tenham alguns poucos objetos cobrindo seus corpos, bem como tatuagens e escarificações. Eles se movem rapidamente e em total silêncio. O rosto é curiosamente largo com feições que lembram um coala, com olhos grandes e amarelados, sem íris e um nariz chato e curto. À noite, seus olhos brilham como o de felinos. As orelhas são arredondadas e em forma de couve flor com vários contornos de cartilagem grossa. A boca é larga, sem lábios, com duas fileiras de dentes afiados usados mais para rasgar do que macerar, eles não possuem língua. As mãos são longas, dotadas de três dedos compridos destituído de polegar. Garras na ponta dos dedos são empregadas como armas e para escavar, elas podem rasgar facilmente uma garganta. Seus pés são longos e possuem garras ainda mais compridas. As unhas são fortes como aço e dificilmente se quebram. Os Habitantes do deserto não são particularmente fortes, mas suas táticas de ataque, circulando a presa e atacando em grupo, lhes garante um trunfo que permite subjugar oponentes mais fortes.
Eles não produzem sons com o objetivo de se comunicar entre si, seus grunhidos e estálidos são usados para assustar a presa depois de surpreendê-la. É quase impossível para um humano diferenciar indivíduos da espécie, já que todos eles tem a mesma aparência genérica.
Os Habitantes são intimidados pelo fogo e fontes luminosas, mas é questão de tempo até superarem o estranhamento inicial. Tochas podem mantê-los a distância, assim como o farol de um carro ou uma lanterna poderosa, mas quando menos se espera, um deles irá avançar e os demais o seguirão. Uma vez que seus músculos são rígidos, eles possuem uma resistência natural a ferimentos, mas isso não significa que eles suportem incólumes um golpe ou um disparo. Armas de fogo podem obrigá-los a recuar, mas apenas até eles se reagruparem para um novo ataque. Essas criaturas não se importam em se sacrificar em pról do bando e o fazem sem pensar duas vezes. Na defesa de seus covis e da fêmea do bando, eles são especialmente determinados, lutando até o último fôlego.
Quando uma dessas criaturas é morta, os demais tentam a todo custo recuperar o corpo. Este é consumido pelo restante do bando, até não restar qualquer sinal de sua existência. Os ossos dos Habitantes se tornam frágeis poucas semanas após a morte e se desgastam como giz. Tentativas de preservar a carcaça de tais seres falharam lamentavelmente.
Os Habitantes podem ser encontrados em áreas isoladas do planeta. Sabe-se de uma grande colônia no Deserto do Arizona sob as Montanhas Superstition e outra no Death Valley da Califórnia. Colonos reportaram a existência de tais criaturas e nativos americanos sempre evitaram tais lugares por saber que esses seres viviam na região. Os Cheyene os conheciam como "o povo que não é nosso irmão", os Cree, os chamavam de "gente do deserto profundo". Sabe-se de outras colônias que prosperam no Egito, Sudão, na Líbia e na Mongólia em regiões impossíveis para o estabelecimento de comunidades humanas. Há rumores de que eles um dia habitaram o Norte da India, mas que foram extintos pelos ghouls que lá são maioria.
É nos Sertão Australiano (o vasto Outback), entretanto que se encontram os maiores e mais temíveis bandos. Os Desertos de Tanami, o Grande Rochoso de Sturt e sobretudo Pedirka são habitats perfeitos para tais seres. A Planície de Nullarbor, ao Norte do Golfo Australiano, também possui uma concentração de Habitantes que são combatidos por tribos de aborígenes, há gerações. A maioria das informações a respeito dessa raça ancestral provém dessas tribos que tiveram contato com eles. Shamans aborígenes elaboraram complexos rituais para banir os Habitantes do Deserto para o místico mundo de Alcheringa, o Reino dos Sonhos, mas as tentativas de se livrar dessas criaturas falharam.
Em 1935, uma Expedição da Universidade Miskatonic que explorou o Deserto de Perdirka entrou em contato com um bando de Habitantes do Deserto. Eles encontraram artefatos curiosos em um complexo de cavernas que julgaram pertencer a uma civilização até então desconhecida. O destino da Expedição é incerto. Em maio daquele ano, a equipe do arqueólogo Thomas Kendal, composta de sete outros professores e graduandos desapareceu nos sertões sem deixar rastro. Em 1947, uma expedição britânica encontrou restos de um acampamento e objetos que posteriormente foram identificados como pertencentes a grupo norte-americano. Entre os objetos havia um diário escrito por Kendal. O último trecho de seus apontamentos foi reproduzido acima. Os curiosos artefatos mencionados por Kendal não foram encontrados, mas fotografias comprovavam sua existência. O mistério sobre o que aconteceu com a Expedição permanece até hoje.
Nota: As imagens pertencem aos onstros do filme The Descent, que ao meu ver se encaixam muito bem na descrição dos Habitantes do Deserto. Creio que eles seriam apenas um pouco mais emaciados e menores, mas como referência visual serve muito bem. O filme em si, serve como uma boa fonte de ideias a respeito do que poderia acontecer com um grupo que inadvertidamente entra no covil dessas criaturas.
Leia sobre outras anatomias das criaturas do Mythos de Cthulhu:
Insetos de Shaggai, os parasitas mentais
Lloigor, os Mestres do Tentáculo
Mi-Go (Fungos de Yuggoth)
Byakhee, crias de Carcosa
Cores do Espaço, o horror que caiu do céu
Vampiros Espaciais, sede de sangue
Shoggoths, bestas servis
Ghouls, os Devoradores de Mortos
Dholes, os Vermes Colossais
Eles não produzem sons com o objetivo de se comunicar entre si, seus grunhidos e estálidos são usados para assustar a presa depois de surpreendê-la. É quase impossível para um humano diferenciar indivíduos da espécie, já que todos eles tem a mesma aparência genérica.
Os Habitantes são intimidados pelo fogo e fontes luminosas, mas é questão de tempo até superarem o estranhamento inicial. Tochas podem mantê-los a distância, assim como o farol de um carro ou uma lanterna poderosa, mas quando menos se espera, um deles irá avançar e os demais o seguirão. Uma vez que seus músculos são rígidos, eles possuem uma resistência natural a ferimentos, mas isso não significa que eles suportem incólumes um golpe ou um disparo. Armas de fogo podem obrigá-los a recuar, mas apenas até eles se reagruparem para um novo ataque. Essas criaturas não se importam em se sacrificar em pról do bando e o fazem sem pensar duas vezes. Na defesa de seus covis e da fêmea do bando, eles são especialmente determinados, lutando até o último fôlego.
Quando uma dessas criaturas é morta, os demais tentam a todo custo recuperar o corpo. Este é consumido pelo restante do bando, até não restar qualquer sinal de sua existência. Os ossos dos Habitantes se tornam frágeis poucas semanas após a morte e se desgastam como giz. Tentativas de preservar a carcaça de tais seres falharam lamentavelmente.
Os Habitantes podem ser encontrados em áreas isoladas do planeta. Sabe-se de uma grande colônia no Deserto do Arizona sob as Montanhas Superstition e outra no Death Valley da Califórnia. Colonos reportaram a existência de tais criaturas e nativos americanos sempre evitaram tais lugares por saber que esses seres viviam na região. Os Cheyene os conheciam como "o povo que não é nosso irmão", os Cree, os chamavam de "gente do deserto profundo". Sabe-se de outras colônias que prosperam no Egito, Sudão, na Líbia e na Mongólia em regiões impossíveis para o estabelecimento de comunidades humanas. Há rumores de que eles um dia habitaram o Norte da India, mas que foram extintos pelos ghouls que lá são maioria.
É nos Sertão Australiano (o vasto Outback), entretanto que se encontram os maiores e mais temíveis bandos. Os Desertos de Tanami, o Grande Rochoso de Sturt e sobretudo Pedirka são habitats perfeitos para tais seres. A Planície de Nullarbor, ao Norte do Golfo Australiano, também possui uma concentração de Habitantes que são combatidos por tribos de aborígenes, há gerações. A maioria das informações a respeito dessa raça ancestral provém dessas tribos que tiveram contato com eles. Shamans aborígenes elaboraram complexos rituais para banir os Habitantes do Deserto para o místico mundo de Alcheringa, o Reino dos Sonhos, mas as tentativas de se livrar dessas criaturas falharam.
Em 1935, uma Expedição da Universidade Miskatonic que explorou o Deserto de Perdirka entrou em contato com um bando de Habitantes do Deserto. Eles encontraram artefatos curiosos em um complexo de cavernas que julgaram pertencer a uma civilização até então desconhecida. O destino da Expedição é incerto. Em maio daquele ano, a equipe do arqueólogo Thomas Kendal, composta de sete outros professores e graduandos desapareceu nos sertões sem deixar rastro. Em 1947, uma expedição britânica encontrou restos de um acampamento e objetos que posteriormente foram identificados como pertencentes a grupo norte-americano. Entre os objetos havia um diário escrito por Kendal. O último trecho de seus apontamentos foi reproduzido acima. Os curiosos artefatos mencionados por Kendal não foram encontrados, mas fotografias comprovavam sua existência. O mistério sobre o que aconteceu com a Expedição permanece até hoje.
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Nota: As imagens pertencem aos onstros do filme The Descent, que ao meu ver se encaixam muito bem na descrição dos Habitantes do Deserto. Creio que eles seriam apenas um pouco mais emaciados e menores, mas como referência visual serve muito bem. O filme em si, serve como uma boa fonte de ideias a respeito do que poderia acontecer com um grupo que inadvertidamente entra no covil dessas criaturas.
Leia sobre outras anatomias das criaturas do Mythos de Cthulhu:
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Shoggoths, bestas servis
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