quinta-feira, 31 de março de 2022

Sete Obsessões que influenciaram a literatura de Lovecraft

Mais de 80 anos após a morte de H. P. Lovecraft, sua influência sobre a cultura popular não mostra sinais de declínio. Em sua própria época, as influências de Lovecraft incluíam escritores de sucesso como o fantasista Lord Dunsany, os escritores ingleses de terror Arthur Machen e Algernon Blackwood, além é claro, de seu amado Poe, possivelmente aquele que mais o inspirava. Contudo, a ficção estranha de Lovecraft também foi moldada por uma série de eventos particulares em sua vida, interesses pessoais e múltiplas obsessões que foram, cultivadas em alguns momentos, realçadas em outros. A peculiar bibliografia de Lovecraft possui contos que revelam um pouco quem ele foi,  com suas idiossincrasias, preconceitos e brilhantismo.

1. ESPAÇO E ASTRONOMIA

Ao contrário da percepção popular, Lovecraft não se tornou exatamente um recluso quando adulto. Muito pelo contrário, ele possuía um círculo de amigos íntimos e empreendia viagens pela Nova Inglaterra e além para visitá-los.

Durante sua adolescência, contudo, ele foi afligido por doenças misteriosas (que podem ter sido de natureza psicológica), que muitas vezes o mantinham em casa e eventualmente o forçavam a abandonar a escola. Sendo um autodidata muito precoce, Lovecraft aproveitou esse período recluso para se educar em várias disciplinas e desenvolveu um grande interesse pela ciência, particularmente pela astronomia. Aos nove anos de idade, Lovecraft começou a publicar sua própria Gazeta Científica. Mais tarde, ele publicou The Rhode Island Journal of Astronomy e começou a enviar artigos astronômicos para publicações locais. Ele recebeu seu primeiro telescópio aos 13 anos, permitindo-lhe satisfazer seu amor pela observação de estrelas.

O fascínio de Lovecraft pelo vasto cosmos serviu de pano de fundo para o tipo particular de horror estranho que ele criou, em que os confins do espaço são povoados por seres incompreensíveis que, como as próprias estrelas, são estrangeiras e indiferentes às preocupações dos homens. Esse fascínio é visto em toda a obra de Lovecraft, mas em particular em A Cor que Caiu do espaço (The Color Out of Space), considerado por muitos como a obra mais sci-fi de Lovecraft. Nela um meteorito com qualidades desconcertantes cai do céu e altera horrivelmente a terra em que pousa, bem como os habitantes da fazenda. Já em "A Sombra fora do Tempo" (The Shadow Out of Time ) somos apresentados à duas espécies extraterrestres explorando a Terra para seus próprios fins e combatendo uma a outra em uma guerra desesperada por sobrevivência. 

Lovecraft também utilizou a descoberta de Plutão, como pano de fundo para conceder credibilidade à seu nono planeta, o terrível Yuggoth que servia como base avançada para outra raça de alienígenas, os Mi-Go. Na época da descoberta de Plutão, Lovecraft chegou a trocar correspondência com Percival Loew um dos astrônomos envolvidos no estudo. O autor se lastimava que suas notas em matemática nunca foram boas o suficiente para lhe permitir seguir carreira na astronomia, ciência que seria sua escolha mais óbvia 

2. O PASSADO

O profundo interesse de Lovecraft pelo passado formou um contraponto ao seu fascínio pelo espaço e pela astronomia. Quando menino, Lovecraft lia volumes da biblioteca particular de seu avô, tornando-se cativado pelo mito e pela história da Grécia antiga e desenvolvendo uma afinidade vitalícia pela era barroca. Um anglófilo dedicado (uma inclinação que provavelmente foi influenciada pela visão de sua mãe Sarah Susan Phillips Lovecraft de si mesma como uma sangue azul da Nova Inglaterra de ascendência inglesa), Lovecraft se mostrava particularmente fascinado pela Inglaterra do século XVIII e pela era da Guerra Revolucionária - embora em seu caso ele desejasse que os ingleses tivessem vencido. 

Ele também adotou grafias do século 18 (seus personagens muitas vezes se ofereciam para “mostrar” algo de interesse um para o outro), e uma vez apareceu em um jornal local usando um chapéu tricorne.

É o fascínio de Lovecraft pela história colonial e pelo puritanismo da Nova Inglaterra, qeue se reflete em mais de um de seus contos, juntamente com seu amor pela arquitetura colonial. Richard Upton Pickman, o personagem central de Pickman's Model (que é descrito como vindo da "antiga estirpe de Salem") quem afirma sobre sua nativa Boston: “Posso mostrar-lhe casas que existem há dois séculos e meio e mais; casas que testemunharam o que faria uma casa moderna desmoronar em pó.” Da 
mesma forma, há rumores de que Keziah Mason de The Dreams in the Witch House era inspirada por uma ou mais bruxas de Salem.

Não exagero dizer que Lovecraft via a si mesmo como uma espécie de antiquário, com uma grande devoção pelas coisas e modos do passado. Em mais de uma carta ele se disse fascinado pela mundo antigo e pelas conquistas dos antigos na mesma proporção que não escondia o desgosto pelo novo.

3. O PASSADO DE SUA PRÓPRIA FAMÍLIA



O pai de Lovecraft, Winfield Scott Lovecraft, foi confinado a uma instituição mental quando era muito jovem, vítima de sífilis, forçando o jovem Howard e sua mãe a morar com o avô Whipple Van Buren Phillips na mansão da família em Providence. Apesar das circunstâncias tristes da mudança, esses foram anos felizes para Lovecraft. Segundo sua biografia, foi lá que ele adquiriu o gosto pela literatura. 

Contudo, problemas financeiros colocaram a fortuna dos Phillips em risco crescente. A morte do avô Whipple em 1904 deu o golpe final, precipitando a venda da propriedade e forçando Howard, sua mãe e duas tias a se mudarem para uma casa mais modesta a três quarteirões a leste da mansão.

Lovecraft nunca superou a perda de sua propriedade familiar, juntamente com as associações de status e felicidade ligadas a isso. Ele passou a vida inteira ansiando pela antiga vida de sua família e arrastou os itens que foram recuperados da propriedade com ele por toda sua vida. Quando chegou a Nova York em 1924 para iniciar um casamento malfadado com Sonia Greene e dois anos malsucedidos de vida na cidade, ele carregava um baú de linho fino, porcelana e livros da propriedade Phillips, que acabaram se amontoando em um apartamento de solteiro no número 169 da Clinton Street, no Brooklyn, quando o casamento começou a desmoronar. 

A história de Lovecraft "Vento Frio" (Cool Air) reflete uma realidade similar: seu personagem central, Dr. Munoz, ocupa aposentos igualmente modestos repletos de ornamentos cavalheirescos. Na verdade, muitos personagens eruditos na obra de Lovecraft apontam para sua idealização do que seria a vida da classe alta.

Em "O estranho caso de Charles Dexter Ward", segredos de família e a herança do passado genealógico figuram como elementos de  suma importância na trama. Os antepassados continuam sendo importantes para o destino dos seus descendentes séculos depois.

4. FRUTOS DO MAR


Lovecraft amava a ciência e amava a história, mas havia uma ladainha de coisas estranhas às quais ele era avesso. Entre eles frutos do mar parece ser o mais estranho. 

Lovecraft foi mimado durante seus anos morando com sua mãe e tias, que lhe permitiram seguir seu próprio horário de sono e inclinações culinárias. Isso pode explicar por que Lovecraft manteve o paladar de uma criança de cinco anos ao longo de sua vida adulta, saboreando doces, mas rejeitando pratos mais adultos. Seu ódio por frutos do mar era tão forte, porém, que parece desafiar a explicação. Em uma ocasião em que um amigo tentou levá-lo para um jantar de mariscos no vapor, Lovecraft (que raramente xingava) teria declarado: "Enquanto você está comendo essa maldita coisa, eu vou atravessar a rua para comer um sanduíche".

Há também relatos de Lovecraft evitando a todo custo visitar mercados e feiras livres onde frutos do mar frescos eram vendidos. Para um nativo de Providence, a repulsa por mariscos devia ser algo complicado, já que muitos pratos locais  incluem frutos do mar. Além disso, sendo uma cidade costeira, frutos do mar estavam no cardápio de praticamente todos restaurantes.

Seja qual for o motivo do extremo desdém de Lovecraft por bolinhos de caranguejo, cavala e lula à dore, isso se provou uma inspiração fértil para muitas de suas criações horripilantes - desde as pessoas suspeitas em "A Sombra sobre Innsmouth" (The Shadow Over Innsmouth) até o popular deus com cabeça de polvo, Cthulhu.

5. A RELIGIÃO E O OCULTO


As histórias de Lovecraft estão repletas de ocultistas de todos os tipos, desde os adoradores de Cthulhu em O Chamado de Cthulhu até os devotos demoníacos em O Horror em Red Hook e os perigosos autores do temido Necronomicon. Enquanto alguns fãs adoram debater se Lovecraft era um ocultista, o fato é que ele não era.

 Embora confessasse ter “inclinações pagãs” quando criança, Lovecraft era um ateu convicto e um materialista autoproclamado. Foi seu ceticismo que o levou a colaborar com Harry Houdini, que se orgulhava de ser um desmistificador da superstição (a publicação da colaboração de Lovecraft e Houdini The Cancer of Superstition foi interrompida pela morte prematura de Houdini em 1926, embora o manuscrito tenha sido recentemente redescoberto).

Lovecraft era profundamente fascinado pelo ocultismo, apesar de sua estridente rejeição a ele. Essa dualidade se devia, principalmente porque o ocultismo  servia para aprofundar a sensação de pavor em seus contos. Apesar do sabor que os cenários ocultos concediam às histórias de Lovecraft, a magia era frequentemente revelada como produto de alguma forma de ciência que a humanidade não entendia. Seu conceito de Horror Cósmico rejeita os confortos da religião, apresentando um universo frio, indiferente e ausente de um Deus benevolente.

6. XENOFOBIA


O preconceito de Lovecraft tem sido uma questão difícil para muitos fãs de terror e fantasia. A xenofobia, de um tipo ou de outro, está no cerne de muitos dos seres estranhos, alienígenas e vis que povoam as histórias de Lovecraft. 

Seu racismo foi mais estridente durante seus malfadados anos na cidade de Nova York, e isso se reflete em trechos em que cita o “labirinto de miséria híbrida”, os “rostos escuros de estrangeiros” e “adoradores do diabo persas” retratados em The Horror at Red Hook , bem como as “pessoas amarelas de olhos vesgos” que pululam sobre a paisagem infernal no final de He. 

Também ficam evidentes em contos anteriores, como The Facts Concerning the Late Arthur Jermyn and His Family, onde a revelação de que Jermyn cruzou com uma deusa macaco branca aponta para um horror à mistura racial. Alguns críticos também encontraram racismo em outras histórias – como o povo peixe de The Shadow Over Innsmouth, ou pessoas mais suspeitas em The Doom That Came to Sarnath … ou talvez ele realmente não gostasse de peixe?

No final da vida de Lovecraft (ele morreu em 1937 aos 46 anos), ele começou a suavizar suas opiniões e a aceitar mais pessoas que eram diferentes dele, mas ele nunca se transformou no que poderíamos chamar de progressista hoje. Muitos fãs modernos acharam difícil conciliar seu respeito por seu gênio com seu desgosto por suas visões problemáticas.

7. LOUCURA


Os personagens das histórias de Lovecraft estão sempre à beira da loucura. Quer eles comecem uma história tendo acabado de escapar de uma instituição mental (como o personagem-título em O Caso de Charles Dexter Ward) ou se eles enlouquecem no final (como o descendente de la Poer em Os Ratos nas Paredes), os personagens estão sempre descobrindo algum conhecimento proibido que os fará perder sua razão e abraçar a loucura.

Lovecraft teve seus primeiros encontros com a insanidade com a hospitalização de seu pai e a instabilidade geral de sua mãe. Pode ser que ele temesse o mesmo destino para si mesmo, já que era propenso a doenças psicossomáticas e sonhos extremamente vívidos na juventude. Se assim for, certamente explicaria sua adoção feroz do materialismo e do ateísmo. No entanto, Lovecraft também via o cosmos como aquele em que o homem existia lado a lado com um conhecimento que, se compreendido, o levaria à beira do abismo.

A loucura não é um mero coadjuvante nas histórias de Lovecraft, ela está em toda parte, pairando como uma ameaça tão aterrorizante quanto os monstros mais assustadores. A insanidade atinge os que leem os livros blasfemos, nos que adoram os antigos e em meio aos que exploram mistérios proibidos.

*     *     *

Lovecraft com suas peculiaridades, suas idiossincrasias e manias, deixou um legado duradouro e uma brilhante obra que nem ele mesmo, poderia imaginar, se tornaria tão importante.

sábado, 26 de março de 2022

Mausoléu do Tirano - A maldição da Tumba de Timur


O mundo está repleto de misteriosos lugares antigos repletos de segredos obscuros perdidos no tempo. Estes são locais com passado ​​bizarro, imersos nas brumas do tempo e com supostas forças místicas que os alimentam até hoje. Seus verdadeiros mistérios permanecem obscurecidos pela passagem dos séculos, infundidos com lendas e mitos. Um desses lugares secretos fica na Ásia Central, ele é o local de descanso de um dos tiranos mais cruéis e sanguinários que o mundo já conheceu, e que dizem conter uma maldição insidiosa até hoje.

Embora seu nome pareça ter sido amplamente esquecido nos tempos atuais, no século XIV poucos nomes podiam ser mais aterrorizantes do que o do conquistador nômade turco-mongol, senhor da guerra e nobre Timur. Comumente conhecido como Tamerlão, ele foi um dos invasores mais cruéis e sanguinolentos da Ásia Central, ou de fato em qualquer outro lugar. 

Através de uma campanha com farto derramamento de sangue, que se estima ter causado a morte de cerca de 17 milhões de pessoas, ou mais chocantemente cerca de 5% da população mundial na época, Timur forjou o Império Timurid em torno do moderno Afeganistão, Irã e Ásia Central. De sua nação ele se lançou em conquistas e vitórias militares sucessivas sobre a Turquia, Iraque, Síria, Uzbequistão, Paquistão, Cazaquistão, Índia e parte da Rússia, tornando-se o primeiro governante da dinastia Timurid. Seu governo forjou a maior dinastia mongol depois do grande Genghis Khan


De fato, Timur se via como herdeiro legítimo de Genghis Khan e é considerado até hoje, um dos maiores líderes militares da história, bem como um mestre estrategista sem igual. Muito temido em toda a Ásia em sua época, as histórias dos poderosos feitos de crueldade e morte de Timur são lendárias, como a pirâmide que ele construiu na Índia feita com os crânios de 70.000 de suas vítimas. Também teria ordenado a devastação, queima e salgamento das terras de adversários para que nada mais crescesse lá. Finalmente, Timur era um seguidor da Lei de Taleão, que mandava cegar homens, amputar suas mãos e pés ou ainda decapitar os desafetos sem qualquer remorso. 

Tudo isso, no entanto, contrastava com ele ser um grande patrono da arquitetura e das artes em geral. Artistas, filósofos e pensadores estavam sempre ao seu lado, e ele pedia que estes interpretassem e explicassem o que estava ao seu redor. Essa faceta ilustrada pode ser percebida através de seu elaborado mausoléu, que não é apenas impressionante pela requintada arquitetura, mas também, pela terrível maldição que, dizem, paira sobre ele.

Chamado de Gur-e Amir, que em persa antigo significa “Túmulo do Rei”, e localizado na antiga e exótica Samarcand, no Uzbequistão, o túmulo de Timur é considerado uma maravilha arquitetônica sem igual na sua época. O mausoléu contém os restos mortais de Timur, que morreu ao tentar conquistar a China em 1405 aos 68 anos, bem como os de seus filhos Shah Rukh e Miran Shah e netos Ulugh Beg e Muhammad Sultan, membros de sua dinastia. O brilhante complexo abobadado em azul é ricamente decorado com tijolos esculpidos e vários mosaicos intrincados. Ele é tido como o precursor e modelo para túmulos posteriores de Mughal, influenciando até mesmo o design do Taj Mahal


O mausoléu deveria ser um lugar de paz e contemplação como desejava seu mais ilustre ocupante. Timur o construiu como uma forma de mostrar que até os mais poderosos governantes são mortais e como tais, um dia deixarão de existir. Embora ele tenha pensado no mausoléu dessa maneira, isso não o impediu de estabelecer que haveria um preço a pagar para quem profanasse seu descanso. Desde o início havia um mito sobre o lugar ser protegido por fantasmas e espíritos.

O primeiro registro da suposta maldição vem de 1740, quando o rei Nader Shah do Império Afsharid decidiu pilhar o sarcófago de Timur. A história diz que a lápide do sarcófago foi acidentalmente quebrada em duas no processo, o que foi visto como um mau presságio. Shah foi aconselhado a devolver os restos mortais ao local original, mas era tarde demais, poucos anos depois seu império caiu em ruínas. A partir desse ponto, dizia-se que perturbar o mausoléu de Timur traria infortúnio e morte, mas isso não impediu que muitas pessoas tentassem invadi-lo.

Sabe-se de ladrões que se arriscaram no Mausoléu e que, dizem as lendas, sofreram um fim terrível graças à maldição do antigo Rei. A maldição não ficaria restrita àquele que cometeu o crime, mas a sua família, aos amigos e as gerações vindouras. Tamanho era o terror dessa maldição que o prédio ficou abandonado por séculos, sendo evitado elo povo de Sarkomand que sequer passava próximo a ele.


Dois outros eventos confirmaram o caráter maldito do Mausoléu e o azar que ele parece atrair aos invasores. Em meados de 1916, o último Czar Romanov do Império Russo patrocinou uma expedição ao Uzbequistão que deveria escavar o Mausoléu em busca de tesouros culturais. A expedição foi marcada por contratempos e revezes desde o início, com um ataque de insurgentes e a morte de dois dos arqueólogos ligados a expedição. Ainda assim, vários itens foram recolhidos, embalados e mandados para a Rússia onde foram expostos com grande destaque.

Nem é preciso dizer que no ano seguinte, o Czar Nicolau Romanov foi derrubado do poder e assassinado, junto com sua família, na revolução empreendida pelos Bolcheviques. Os tesouros de Timur foram então confiscados pelo estado e guardados por décadas.

Anos mais tarde, fascinado pela história de Timur, o ditador Joseph Stalin enviou uma equipe de arqueólogos para invadir o Mausoléu e exumar os restos mortais de Timur para estudo. Um dos objetivos principais era determinar se ele tinha raízes russas. Sob a direção do cientista e antropólogo soviético Mikhail Mikhaylovich Gerasimov, a expedição foi marcada novamente por estranhos incidentes. Os estudiosos entraram na tumba e imediatamente encontraram avisos gravados que diziam: “Somos todos mortais. Chegará a hora e todos partiremos. Se alguém perturbar as cinzas dos ancestrais, sofrerá severa punição”. Outra famosa inscrição alertava: “Quando eu ressuscitar dos mortos, o mundo estremecerá” e finalmente “Quem perturbar minha tumba atrairá um invasor mais terrível do que eu”. 

Os arqueólogos talvez devessem ter ouvido essas ameaças, mas mesmo assim, profanaram as sepulturas, ignorando os apelos dos sábios sufis que imploravam para que não incorressem na transgressão. Gerasimov localizou os restos mortais de Timur e os removeu para estudo. Isso ocorreu em 19 de junho de 1941, apenas três dias antes das tropas de Adolf Hitler invadirem a União Soviética, sem qualquer declaração formal de guerra. A longa e sangrenta campanha nazista na Frente Oriental acabaria levando à morte cerca de 26 milhões de pessoas. 


Em meio a invasão, Stalin se convenceu de que a profanação da tumba poderia ter sido uma má ideia e ordenou que os restos mortais de Timur fossem devolvidos ao local de descanso em dezembro de 1942. Ordenou ainda que o Mausoléu fosse reformado por completo e sua glória devolvida. Pouco depois, o exército alemão começou a reduzir seu ímpeto até que foi derrotado na sangrenta Batalha de Stalingrado, marco do fim da Invasão à URSS. 

Fato ou mera coincidência, quem pode saber?

É difícil dizer quanto dessa conversa de maldição é verdade e quanto é pura lenda. Tudo parece simples folclore, criado para afastar e assustar saqueadores. No entanto, a história mostra que aqueles que ousaram profanar o descanso do Tirano perderam, ou ao menos foram ameaçados naquilo que mais desejavam: poder.

O sítio atualmente está aberto, sendo visitado por milhares de turistas anualmente, mas parece que existe todo um protocolo à respeito da visita a esse lugar. Os guias instruem os visitantes a não encostar nas pedras desnecessariamente e evitar remover qualquer coisa do interior da construção. Da mesma maneira, recomenda-se que os visitantes antes de entrar, façam um sinal que simboliza respeito, para evitar qualquer mau entendido com os espíritos. Afinal, nunca se sabe que forças obscuras podem estar presente neste lugar antigo.

quarta-feira, 23 de março de 2022

A Caixa de Brinquedos do Diabo - Um aposento maldito em uma casa assustadora


Localizada perto da cidade de Leesville, na zona rural ao norte da Louisiana, a cerca de 3 horas de carro de Nova Orleans, existia uma atração no estilo casa mal-assombrada chamada Farmer Grave's Haunted Orchard. O lugar foi supostamente criado para atrair curiosos em busca de emoções baratas e sustos inocentes. Dizem que no passado ali havia um cemitério, mas dele restou apenas algumas lápides e sepulturas antigas, árvores cobertas de líquens e uma aura sinistra que remetia à histórias de fantasmas e assombrações.

No entanto, era ao lado desse lugar que havia algo muitíssimo mais macabro e estranho. 

Era um lugar pelo qual a maioria das pessoas passariam direto, sem prestar muita atenção o que seria ótimo para elas. Tratava-se de um casebre simples de madeira com ares de abandono. Uma cabana isolada, com paredes sujas precisando de pintura e telhado com telhas faltando. Ao seu redor, o mato crescia selvagem e as pedras de um velho calçamento desapareciam em meio às heras venenosas. O lugar tinha uma aura indescritível, que inspirava um pressentimento desagradável naqueles sensíveis a tais coisas. Mas não era a casa em si, que a tornava macabra, mas o que havia em seu interior. 

Dentro deste pequeno barraco, dizem que havia um aposento com espelhos cobrindo do chão ao teto. Centenas de espelhos dispostos em ângulos específicos e de frente um para o outro. Não se sabe qual a intenção original dessa instalação ou o que seu criador pretendia, mas de acordo com a lenda, todos os tipos de coisas esquisitas e paranormais ocorriam ali dentro. Ao ponto dele ganhar o sinistro nome de "A Caixa de Brinquedo do Diabo". 


Assim tem início uma Lenda Urbana sinistra à respeito de um casa que enlouquece as pessoas que nela entram e que atrai uma miríade de forças diabólicas.

Uma das teorias é que o responsável pela estranha instalação foi um ocultista que nos anos 1960 acreditava ser capaz de prender nos espelhos fantasmas ou demônios que ele próprio invocava. Os que defendem essa teoria apontam que os espelhos tinham estranhos símbolos arcanos arranhados nas bordas, símbolos estes que remetiam a Goétia. As entidades atraídas eram presas nesses espelhos através de rituais, e uma vez capturadas, seriam forçadas a obedecer o mago que as invocou. Outra suposição é que a casa serviu de covil para um assassino em série que usava os espelhos para refletir de vários ângulos o horror das pessoas capturadas e torturadas por ele. A última coisa que elas viam era sua própria expressão de sofrimento indescritível, refletida centenas de vezes.

Embora a origem da cabana e o propósito dos seus espelhos fossem assunto aberto a suposições, outras histórias sobre ela mencionavam uma lenda urbana comum.  

A história principal é que as pessoas que visitavam a casa simplesmente não suportavam ficar na sala dos espelhos por muito tempo. Diz-se que ninguém aguentava mais de uma hora no aposento, com a média sendo de apenas vinte minutos antes que certos sintomas misteriosos começassem a aparecer. Os tais sintomas, incluíam náuseas, desorientação, tremores, tonturas, alucinações visuais e auditivas e até mesmo violentas convulsões. Aparentemente, quanto mais tempo alguém ficasse lá dentro, piores os efeitos. O máximo que alguém supostamente se manteve no aposento foram três horas e trinta e sete minutos. O recorde foi estabelecido por um pai de três filhos de 52 anos chamado Roger Heltz. Mas Roger não teve do que se orgulhar, pois, dizem que, após a experiência, ele começou a se comportar de maneira estranha e se tornou um sujeito taciturno e triste. Terminou sua vida quase como um mudo, dado a contemplar o nada com uma expressão amargurada. 


Mas há mais histórias sobre a Caixa de Brinquedos do Diabo, muitas outras...

Os rumores começaram a circular impulsionados pela Internet. Todos os tipos de contos bizarros surgiram aqui e ali. Dizia-se que ficar muito tempo no casebre poderia enlouquecer as pessoas, muitas vezes levando-as ao suicídio ou transformando-as em lunáticas delirantes. Abundam os relatos de pessoas fugindo do aposento espelhado aos gritos, após ver fantasmas ou demônios lá dentro. Narrativas de gente morrendo de ataques cardíaco, sendo hospitalizadas ou deixando o barraco cobertas de arranhões e hematomas misteriosos também eram frequentes, e conforme a lenda evoluiu, foi dito que se você aguentasse ficar no barraco por tempo suficiente, o próprio Diabo apareceria num vislumbre medonho do espelho. 

Há até relatos de pessoas entrando no barraco apenas para desaparecer sem deixar rastro como se tivessem sido tragados por forças diabólicas que habitam o outro lado. Fóruns da Internet estão cheios de histórias como essas, sendo difícil definir as fronteiras entre verdade, lenda urbana ou absurdas creepypastas criadas pelo conteúdo chocante.

Depois de algum tempo, os donos do Farmer Grave's Haunted Orchard, um casal de meia-idade chamado Will e Darlene Sawyer, fecharam sua atração e se mudaram. Mas a Caixa de Brinquedos do Diabo permaneceu lá, acumulando poeira e ervas daninhas, e a partir daí, parece ter se tornado alvo popular entre invasores curiosos desejando testar sua sorte no seu interior. À medida que os rumores sobre o casebre se multiplicavam, os contos de estranheza paranormal continuaram, com novos elementos e floreios. Havia agora histórias sobre sombras e criaturas estranhas à espreita na floresta ao seu redor. O antiga cemitério também se converteu numa área maldita, com toda sorte de fantasmas pavorosos a assombrá-lo. O barraco foi apontado como último lugar onde inúmeros adolescentes foram vistos pela última vez. 


A lenda continua até hoje, com alguns relatos afirmando que o barraco foi demolido por um homem chamado John Tyler, que o incendiou após ele próprio ter entrado em busca de sua filha desaparecida, vista dias antes, no local. Enquanto ardia nas chamas que o consumiu, o barraco emitiu sons distorcidos de uma realidade atroz. Quando os espelhos trincaram e se estilhaçaram mais parecia o ruído das garras do diabo arranhando o vidro. Mas nem mesmo o esforço de John Tyler logrou algum resultado positivo, pois supostamente as ruínas do barraco teriam se reconstruído da noite para o dia. Ao saber disso, Tyler teria corrido para o lugar e ao vê-lo incólume, colocou os dois canos de uma espingarda na boca e disparou. Outros, no entanto, afirmam que o casebre não ressurgiu, ele simplesmente apareceu em outro canto isolado, atraindo curiosos para seu interior insalubre como uma vela atrai mariposas. 

É difícil dizer se esses relatos tem algum fundo de verdade ou se não passam de simples lendas urbanas. Mas algumas pessoas juram que a Caixa de Brinquedos do Diabo de fato existe. A ideia é que os espelhos estariam de alguma forma se alimentando de energias paranormais atuando dentro daquela cabana infernal, servindo como portais para outras realidades, invocando o que quer que exista nesses planos, trazendo-os para nosso mundo.

Na internet é possível encontrar sites em que exploradores do desconhecido compartilham as últimas aparições do casebre. Um roteiro menciona até mesmo onde ele pode ser visitado e oferece os serviços de guias para levar os curiosos até ele. Claro, isso tudo deu origem a ainda mais histórias e ainda mais especulação.

Tudo indica que a Caixa de Brinquedos do Diabo não passa de uma simples lenda urbana, divulgada como algo real, com o intuito de causar alguns arrepios. Entretanto, cautela e bom senso sempre são bem vindos. Em 2017 um grupo de amigos, explorando um lugar apontado como o casebre das lendas, sofreu um acidente em Macon, Texas. Um jovem explorador de 17 anos despencou em um buraco e acabou morrendo. Para ele, a brincadeira acabou mal, mas para outros, a narrativa se tornou apenas mais um detalhe mórbido sobre um lugar que inspira (e continuará inspirando) muitos sustos.

A Casa está de portas abertas à todos, você teria coragem de adentrar seu quarto espelhado? 

domingo, 20 de março de 2022

USS Cyclops - Um dos mais Misteriosos Desaparecimentos de Navios na História


Com quase 168 metros de comprimento, o USS Cyclops era um dos maiores navios do arsenal da Marinha dos EUA em março de 1918. Com apenas oito anos de serviço, o Cyclops era um verdadeiro titã naval, batizado em homenagem aos lendários gigantes da mitologia grega, os ciclopes. Seu nome era bastante adequado, mas não se referia apenas ao tamanho. Ele impressionava pela capacidade de carga, velocidade, aparelhamento moderno e potência dos motores. Tudo nele era colossal.

Não por acaso, os jornais o definiam como uma cidade mineradora flutuante, tamanha a quantidade de carvão que ele era capaz de transportar em seus vastos compartimentos de carga - algo em torno de 13 mil toneladas. A função principal do Cyclops não era apenas transporte, mas abastecimento. Em uma época em que os navios navegavam queimando toneladas de carvão, ter um navio de abastecimento num comboio era essencial em termos de logística. Isso fornecia um trunfo decisivo para a Marinha Norte-Americana ir onde bem entendesse.

Na sua última viagem oficial, o Cyclops partiu do gélido Porto de Norfolk, em Maryland com destino ao Brasil, onde deveria apanhar uma carga de 11 mil toneladas de manganês. Era uma das maiores vendas de minério da história do Brasil e os americanos precisavam urgentemente dela para a Guerra na Europa na qual eles haviam entrado recentemente. A carga seria usada para a produção prioritária de armas e equipamento.

O navio, com uma tripulação de 300 almas seguiu para o porto do Rio de Janeiro para abastecimento e a primeira parte da viagem transcorreu sem maiores problemas. O Cyclops e sua tripulação não eram estranhos ao mar. Tendo estado em operação frequente desde 1910, o enorme navio de transporte era um visitante regular de portos no México e do Caribe, sendo frequentemente utilizado no transporte de carvão para vários locais. Ele também havia ido recentemente até a Inglaterra onde deixara tropas, suprimentos e armas.


No retorno, o experiente Comandante George Worley enviou uma mensagem logo depois de deixar o Porto de Barbados. Ele havia feito uma parada para corrigir alguns pequenos problemas no navio, mas deixou claro que não havia motivos para preocupação. Em seguida, o Cyclops seguiria para concluir o trajeto de retorno até Baltimore. "Tempo bom, tudo bem" transmitiu através do rádio se referindo aos mares tranquilos que esperava adiante. Ninguém poderia imaginar que aquela seria a sua última mensagem. Ao longo dos nove dias que se seguiram, o prazo estimado de chegada, o Cyclops simplesmente não fez mais nenhum contato e em algum ponto desapareceu nas águas do Atlântico.

Parece razoável assumir que algo deu terrivelmente errado durante a travessia. Algo que até hoje é motivo de debate, conjecturas e questionamento. Quaisquer que sejam os eventos que levaram ao desaparecimento do navio, aconteceu tão rapidamente que não houve tempo de enviar um sinal de socorro, baixar um barco salva-vidas ou fazer qualquer indicação de que a carga e os tripulantes estavam em perigo. 

O Cyclops desapareceu dos mares que singrava e se tornou um dos maiores enigmas náuticos da história.

Geralmente, um balde de madeira ou um colete salva-vidas de cortiça identificado como pertencente a um navio perdido é recolhido após um naufrágio, mas não foi o que aconteceu com o Cyclops. Nada, absolutamente nada transpareceu!


À princípio, boatos alertaram de que o navio havia sido avistado navegando à esmo na Costa de Virginia, mas os barcos de busca que patrulharam a área não encontraram nada. Também foram mencionados avistamentos de uma embarcação de grande porte navegando à deriva pelo norte das Bermudas, mas estes também não foram confirmados. Até mesmo aviões de reconhecimento, uma tecnologia recente, foram empregados na tentativa de desvendar o mistério. Nenhum resultado foi obtido.

O mistério de seu desaparecimento permanece sem solução mais de um século depois. O que poderia ter acontecido com o Cyclops durante sua fatídica viagem de retorno a Baltimore?

À medida que pesquisadores históricos e investigadores amadores sondaram o mistério exaustivamente durante as décadas seguintes, as menções sobre o lendário Triângulo das Bermudas se tornaram irresistíveis. O lugar, afinal constitui um dispositivo conveniente para defensores do paranormal e toda sorte de mistérios. De uma coisa os céticos não podiam se desviar, o Cyclops estava navegando justamente através do Triângulo no momento em que desapareceu sem deixar vestígios.


Algumas sugestões sobre o que teria acontecido causaram controvérsia, entre as quais, a formação de um imenso redemoinho ou vórtex que teria causado o naufrágio do navio, levando-o para as profundezas em poucos minutos. Também se cogitava a possibilidade de um submarino alemão ter realizado um ataque surpresa, embora não fosse provável haver u-boats tão distantes naquela altura da guerra. Poderia também a embarcação ter se chocado com uma mina submarina. Outros diziam que uma forte tempestade como as que se formavam repentinamente no Mar do Caribe poderia ser responsável por virar o Cyclops. 

Teorias mais plausíveis sobre o destino do navio incluíam a ideia de que o Cyclops possuía um problema estrutural que se acentuou quando a carga de 11 mil toneladas foi embarcada. Essa teoria até ganhou corpo quando as autoridades portuárias de Barbados confirmaram que o cargueiro recebeu reparos emergenciais e que se cogitou desembarcar parte de sua carga de manganês por uma questão de segurança. O Comandante, no entanto, não aceitou o conselho de fazê-lo e decidiu seguir em frente - ele sabia da necessidade premente de entregar a carga. 

Outros mencionaram o boato de que Barbados estava cheia de espiões e sabotadores. Um agente inimigo poderia ter se infiltrado à bordo e causado uma explosão em alto mar usando para isso algum dispositivo temporizador. Ambas possibilidades podiam de fato explicar o desaparecimento, mas não eram suficientes para explicar como nenhum destroço havia sobrevivido. Um navio das dimensões do Cyclops não vai simplesmente para as profundezas sem deixar alguma pista.

Com o passar do tempo, alguns olharam além do horizonte em direção a outras possibilidades. Em vez de ação inimiga – uma teoria para a qual há tão pouca evidência quanto há para o paradeiro do próprio Cyclops – alguns pesquisadores propuseram que o Capitão do navio, George Worley, poderia ter sido o culpado pelo desaparecimento. Teorias envolvendo tudo, desde o gosto de Worley por bebidas fortes, até relatos de motim a bordo do navio, levaram a investigações da Marinha. Eles também se concentraram nos meses que antecederam ao desaparecimento do navio buscando algum indício de um agente externo sabotador. 


Apuraram que Worley mantinha uma relação conflituosa com sua tripulação e que alguns chegaram a denunciá-lo como pró-alemão. Realmente, Worley embora tivesse cidadania americana havia nascido na Alemanha e mudado seu nome pouco antes do início da guerra. Alguns se recordavam dele dizer que "os motivos para a guerra eram justos para a Alemanha e que ele esperava que seu país natal vencesse o conflito'. É claro, sua opinião provavelmente mudou quando os Estados Unidos entraram no conflito, mas muitos estavam dispostos a contar o que ouviram o Capitão falando anos antes. 

Outro detalhe apurado dava conta de que o Cônsul Especial da Embaixada Americana no Rio de Janeiro embarcou repentinamente no Cyclops. O homem chamado Moreau Gottschalk, era obviamente descendente de alemães e também mantinha uma indisfarçável simpatia pela causa germânica, tendo chegado a participar de atos favoráveis ao país no Brasil. Os motivos para seu embarque não ficaram claros, mas alguns amigos próximos garantiram que ele sofria de depressão e que havia mencionado repetidas vezes que o envolvimento da América na Guerra era um erro. 

Poderia um deles ou ambos terem conspirados para afundar o Cyclops e causar um revés ao esforço de guerra norte-americano? E se foi isso, estariam dispostos a morrer por essa causa? Nenhum dos dois sobreviveu para contar a história.

Apesar de todas as suspeitas, a investigação da Marinha inocentou Worley e Gottschalk das acusações e não encontrou motivos para suspeitar que eles tenham agido sozinhos ou em conluio para destruir o navio e sua valiosa carga. Realmente, os investigadores apuraram que o cônsul no Rio havia se desligado da missão com o intuito de se alistar, seguir para a Europa e lutar pelo seu país.


Apesar da limpeza do nome de Worley, os investigadores acharam as circunstâncias do desaparecimento do Ciclope não menos preocupantes, com a Marinha emitindo uma declaração oficial que chamou o incidente de "um dos mistérios mais desconcertantes dos anais da Marinha". O mesmo documento acrescentava que "todas as tentativas de localizar a embarcação falharam". Um dos investigadores responsáveis chegou a apresentar um estudo que se amparava no curso de águas e marés para demonstrar que ao menos alguns destroços deveriam surgir em determinada região. Nada foi achado e ele cunhou a frase: "não há como explicar o inexplicável sem dados suficientes".

Uma teoria proposta por Marvin Barrash, descendente de um dos homens que presumivelmente afundou com o navio, acredita que um evento conhecido como Tempestade Perfeita poderia ter causado o naufrágio. Este incidente não se refere a um evento climático, mas uma combinação de elementos que sozinhos não seriam capazes de causar o desfecho, mas que combinados teriam êxito. Portanto, uma sequência de elementos: do carregamento superpesado de magnésio no navio, combinado com falhas estruturais e algum elemento exterior, como uma tempestade inesperada, provavelmente teriam causado o desastre. Como o Cyclops navegava nas proximidades da Fossa de Porto Rico, provavelmente teria naufragado em águas profundas. Lá ele supostamente permanece escondido até hoje, numa sepultura marinha inacessível.

Mas será que foi apenas isso? Um acidente trágico, raro, mas convencional? Não haveria algum elemento adicional relacionado de alguma maneira? Algo, digamos, sobrenatural?

Anos mais tarde, as teorias à respeito da região conhecida como Triângulo das Bermudas trariam novas teorias para o desaparecimento. Teorias sobre abdução alienígena, uma bolha de energia submarina, portais dimensionais, deslocamento temporal, contato com formas de vida submarinas... todo tipo de teoria ganhou força, amparadas pela quantidade assombrosa de incidentes inexplicáveis ocorridos nessa área em particular. 


De fato, desde o início das viagens marinhas por essa região, desaparecimentos e casos estranhos se multiplicam nos relatos de navegadores. Com o tempo, e a proliferação de rotas cortando o Triângulo, mais e mais casos aconteceram, fazendo com que essa área geográfica ganhasse fama internacional.

Os relatos conflitantes sobre o suposto avistamento do Cyclops também foram responsáveis por um elemento adicional de mistério paranormal. Navegadores e tripulações inteiras juraram ter visto uma embarcação de grande porte aparentemente sem destino no Triângulo das Bermudas. Mas sempre que o navio era perseguido ou dele se aproximavam, um estranho fenômeno climático, parecido com um nevoeiro parecia cercá-lo e sumir com ele. Em um dos casos mais emblemáticos, um navio com bandeira panamenha teria se aproximado o bastante do Cyclops para ler o seu nome no costado. teriam tentado se aproximar ainda mais, mas de um momento para o outro o navio simplesmente desapareceu como se fosse uma visão fantasmagórica.

Poderia o Cyclops ter sido transportado para outra realidade, outro plano ou mesmo, outra dimensão da qual emerge, apenas como um vislumbre fugaz? E se tal coisa for verdade, como aconteceu e qual o destino da tripulação? Alguns teóricos conspiratórios afirmam que o incidente com o Cyclops seria um exemplo notável de deslocamento espaço-temporal, fenômeno que o governo americano passou a estudar dali em diante e sobre o qual possui extenso material.


E é claro, existem os que afirmam ter sido o Cyclops abduzido por alguma raça extraterrestre ou veículo espacial que o transportou para outro lugar. O filme Contatos Imediatos do Terceiro Grau, mostra o Cyclops sendo encontrado no Deserto de Gobi, na Mongólia, transportado, sabe-se lá de que maneira. O filme explica o ocorrido através da ótica extraterrestre.

No fim das contas, sejam lá quais forem as circunstâncias que fizeram o navio sumir junto com seus 300 tripulantes, tornou-se parte da história. Ele é considerada a maior perda de vidas na história naval dos EUA, sem uma solução oficial. 

O Cyclops é um marco do mistério marítimo e aparentemente fadado a continuar dessa maneira pela eternidade, ou até que alguém o encontre nas profundezas. 

Adendo:

Como curiosidade, encontrei alguns recortes de jornais da época, publicados em jornais do Brasil sobre o mistério do Cyclops. Eles são bem interessantes pois mostram a confusão entre as pessoas que não entendiam como um navio das dimensões do cargueiro poderia desaparecer daquela forma.





sexta-feira, 18 de março de 2022

A Face dos Deuses - As Cabeças Gigantes da Guatemala


Uma terra famosa por seus estranhos templos, monumentos, esculturas e cultura, a Guatemala abriga mais mistérios sem solução do que qualquer outro lugar do mundo. Com um passado tumultuado e um povo que sofreu com guerras, conquistas, doenças e desastres econômicos, o país esconde segredos que a história ainda procura decifrar.

A Guatemala pode de fato ser o berço de todas as cultura mesoamericanas. Seus primeiros assentamentos datam de 18.000 aC, como é evidenciado pela descoberta de pontas de flecha de obsidiana em todo o território. Acredita-se que esses povos pré-colombianos tenham sido os primeiros a desenvolver práticas agrárias na América do Sul, com evidências do cultivo de milho ao longo da Costa do Pacífico, se espalhando por terra ao longo dos séculos. De toda forma, a área que hoje conhecemos como Guatemala foi no passado o centro do Grande Império Maia e, como tal, inestimáveis tesouros arqueológicos estão ocultos dentro das suas fronteiras.

Um dos mistérios mais fascinantes envolve as cabeças colossais dos olmecas. O povo olmeca, surgiu no sudoeste do México por volta de 1500 aC. Eles foram os primeiros grandes construtores das Américas. Pioneiros em erguer monumentos, sua cultura deu origem a templos de pedra, pirâmides, altares, estátuas, e cidades de grande porte. Infelizmente, há muito que não sabemos sobre quem foram eles, mas o pouco que sabemos já é muito interessante.

As cabeças colossais são uma coleção de 17 enormes cabeças de pedra com várias toneladas de peso, esculpida em basalto e distribuídas pelas selvas do centro da Guatemala. Todas retratam indivíduos com as mesmas características físicas: rostos masculinos com bochechas carnudas, narizes achatados e olhos levemente vesgos. Essas características são consistentes com a estrutura facial dos descendentes olmecas modernos, e a maioria dos estudiosos acredita que as cabeças - feitas com pedras extraídas das montanhas da Sierra de los Tuxlas de Veracruz, elas foram movidas a longa distância, com grande esforço por um terreno acidentado.


Elas supostamente retratam o rostos de importantes líderes da sociedade olmeca primitiva. Possivelmente são Reis e Governantes que detinham o poder de vida e morte sobre milhares de pessoas. A maioria das cabeças foram enterradas por volta de 900 aC, o que significa que elas foram esculpidas e apresentadas bem antes disso, embora as próprias cabeças não possam ser datadas com precisão. Por qual motivo elas teriam sido enterradas também constitui um mistério, já que elas foram dispersas por diferentes regiões ao invés de serem simplesmente enterradas no local onde estavam.

Os mitos por traz dessas magnificas estátuas incluem a crença de que elas representariam deuses que nasceram homens ou ainda deuses que teriam descido dos céus em carruagens mágicas que os transportaram do firmamento para o solo. Também havia a crença de que as cabeças retratam os filhos dos deuses apontados por eles para governar a Nação Olmeca.

Entre os motivos para as estátuas serem escondidas, há suposições de que haveria uma tentativa de protegê-las de inimigos que poderiam querer destruí-las. Uma vez que cerca de meia dúzia de cabeças foram encontradas semidestruídas, existe a hipótese de que facções desejavam apagá-las para sempre. 
Finalmente, as estátuas podem ter sido escondidas por uma série de superstições e crenças enraizadas na Cultura Maia, de que a face dos deuses não deveria ser vista e menos ainda conhecida pelos mortais. seguindo esse preceito, algumas cabeças colossais poderiam ter sido deliberadamente escondidas para evitar que tivessem um fim nas mãos de indivíduos interessados em sua destruição.


Contudo, existe um outro mistério à respeito das Cabeças Gigantes, mais intrigante e profundo, que todos os outros:

Ele tem inicio em 1987, quando o Dr. Rafael Padilla Lara recebeu uma fotografia de uma enorme cabeça de pedra que teria sido descoberta nas selvas da Guatemala na década de 1950. A cabeça teria sido encontrada pelo proprietário de um terreno que havia mandado limpá-lo para realizar uma construção. Quando o solo começou a ser remexido revelou o objeto colossal. 

A descoberta de uma cabeça de pedra em um país cheio de cabeças de pedra não é exatamente uma novidade, exceto pelo fato de que essa cabeça era muito diferente das outras. De fato, ela não parecia em nada com as demais. Todas as cabeças de pedra esculpidas achadas até então possuíam uma óbvia consistência antropológica com o povo local, já esta, era muito diferente. Os lábios finos e pronunciados, com bochechas rasas, nariz grande e pontudo e a face virada para cima evidenciavam algo totalmente diverso das demais descobertas.

Alguns estudiosos, como David Childress, famoso autor e proponente da teoria dos Deuses Alienígenas, afirmaram que a Cabeça Colossal de Padilla era uma evidência de que rostos caucasianos (leia-se: europeus) já eram conhecidos pelas culturas pré-hispânicas da América do Sul. Childress alegava ter entrevistado Padilla, que por sua vez afirmou que a cabeça foi encontrada perto de uma pequena aldeia chamada La Democracia, no sul da Guatemala. A descoberta foi um acontecimento fartamente documentado e que contou com muitas testemunhas. A Cabeça chegou a ser movida e foi fotografada, conforme vemos no alto do artigo. 


Contudo a cabeça foi dinamitada por militantes revolucionários na década de 70, dez anos antes de Padilla ter conhecimento de sua existência. Esse procedimento infelizmente era bastante comum entre guerrilheiros que destruíram artefatos arqueológicos importantes para chamar a atenção para suas causas. Desde 1960 incontáveis peças foram completamente arruinadas.

Com tudo isso, as únicas evidências que temos da existência da Cabeça é uma fotografia e o testemunho dos que a viram. Pouco se consideramos o caráter bizarro dessa estátua em particular.  Mas ainda há coisas muito estranhas relacionadas a Cabeça de Padilla. 

A grande maioria dos pesquisadores que analisaram a foto julgaram que não há dados suficientes para corroborar a autenticidade da estátua. Apesar das poucas evidências, há quem acredite que existe mais do que se supõe e que a cabeça poderia ser a prova de contato entre povos europeus e os Olmecas muito antes de Colombo. Mas há outra possibilidade que veio à tona recentemente e que parece ter sido negligenciada pela maioria dos pesquisadores.


Quando se olha para a foto da cabeça de pedra ela lembra características faciais conhecidas, vistas muitas e muitas vezes em fotos e documentários sobre uma pequena Ilha do Pacífico, localizada a cerca de 3.500 quilômetros a oeste da América do Sul. O rosto que vemos na foto da cabeça de pedra de Padilla é surpreendentemente semelhante (embora não idêntico) a fisionomia dos Moai de Rapanui, as estátuas encontradas na Ilha de Páscoa. Ela tem lábios finos, narizes pontudos e queixo erguido em uma postura magnânima. Haveria alguma conexão? Calma, não diga "bobagem" sem antes ler o restante dos argumentos. 

Até outubro do ano passado, pensava-se que o contato entre os habitantes de Rapanui, os Ilhéus de Páscoa com culturas mesoamericanas pré-coloniais era virtualmente impossível, ou pelo menos altamente improvável. Na verdade, a própria ideia parecia absurda não apenas pela distância mas por muitos outros fatores. Uma raça primitiva de ilhéus que pode ou não ter causado sua própria morte através do desmatamento e fome, poderia encontrar seu caminho através de 3.500 quilômetros no Oceano Pacífico em pequenos barcos não mais sofisticados do que jangadas? Se alguém tentou, certamente pereceu ao longo da jornada. Certo?

Bem, não é bem assim, conforme demonstram provas contundentes de que tal contato provavelmente aconteceu. 

Resultados de DNA publicados pela revista Current Biology atestam um contato bidirecional entre a Ilha de Páscoa e as primeiras culturas mesoamericanas, incluindo os olmecas, muito antes do contato europeu. Os pesquisadores encontraram uma semelhança genética determinante que remete ao povo de Rapanui em amostras colhidas na América Central. Além disso, tudo indica que práticas culturais, crenças, tradições e até métodos de escultura, fabricação de ferramentas e estilização de obras de arte podem ter sido compartilhadas por esses povos primitivos tamanhas suas similaridades. Tal compartilhamento só seria possível através de um contato extensivo ao longo de várias centenas de anos. Ou isso, ou permitido por algum método de contato desconhecido e claramente esotérico. 


À luz disso, seria razoável supor que a Cabeça de Padilla possa ser uma tentativa de replicar a aparência de estátuas de uma terra distante? Mais especificamente os Moai da Ilha de Páscoa? Poderia um artesão olmeca reproduzir uma estátua sem ter visitado o lugar onde elas estão, mas isso pressupõe que deveria haver troca de informações.

Os defensores da teoria do Antigo Astronauta defendem que povos de diferentes partes do planeta, separadas por distâncias absurdas, podem ter estabelecido contato no passado. Mas como teria ocorrido esse contato? Por intermédio de quem? Em que circunstâncias? E com que motivos?

Esses mistérios do mundo antigo seguem atormentando os pesquisadores que por vezes tropeçam em anomalias históricas difíceis de explicar e por vezes, difíceis de aceitar.

quarta-feira, 16 de março de 2022

Mesa Tentacular: Machine Tractor Station Kharkov-37 - Mythos e Paranóia na União Soviética de Stalin

 

Nos anos 2000, a Chaosium, editora responsável por Chamado de Cthulhu, deu início a um projeto que tencionava lançar vários suplementos para seu RPG mais famoso. A ideia era publicar trabalhos de autores menos conhecidos ou material de fãs em um formato mais acessível e barato. Esse material foi chamado de Monografias e cerca de 40 delas foram publicadas até meados de 2010. Algumas monografias eram boas, a grande maioria tinha qualidade mediana e algumas infelizmente eram bem ruins.

Uma desses trabalhos, no entanto, se destacou desde o início e acabou se tornando a mais bem sucedida e conhecida dentre todas monografias. Escrita por Bret Kramer e publicada pela primeira vez em 2004, Machine Tractor Station Kharkov-37 (doravante apenas Machine Tractor), é um cenário one-shot com personagens prontos se passando na gélida União Soviética no ano de 1933.

Cenários de Chamado de Cthulhu tendo como pano de fundo momentos históricos tumultuados não são exatamente uma novidade, mas na época em que foi lançada, Machine Tractor era uma tremenda inovação. Ela tirava os jogadores de sua zona de conforto, a cidadezinha assombrada de Arkham ou alguma metrópole americana na Era do Jazz, e os lançava em um ambiente insalubre, repleto de desconfiança e paranoia, no auge dos expurgos de Stalin.

Um cenário nesse contexto já seria interessante por si só, permitindo ao Guardião explorar um ambiente no qual os personagens teriam de transitar nos bastidores do poder, lidando com burocratas, informantes e membros do partido dispostos a tudo para provar sua devoção ao Estado, inclusive denunciar os menores deslizes dos seus colegas. Junte a esse pesadelo orweliano uma pitada generosa de Horror Cósmico e pronto, temos a receita para algo realmente atraente.

Machine Tractor é um cenário bem montado sobre uma premissa aparentemente simples. A trama se desenrola em duas ou três sessões no máximo. Os investigadores assumem o papel de militares e técnicos de comunicação filiados ao Exército Vermelho que recebem uma missão de rotina. Eles devem seguir para uma comunidade isolada, uma fazenda coletiva chamada Kharkov-37 afim de reestabelecer as linhas de telégrafo que foram cortadas durante o inverno. Sem comunicação, ninguém sabe ao certo como estão as pessoas que trabalham na fazenda e como passaram o inverno. No entanto, desde o início parece haver algo muito estranho acontecendo.


Não é apenas o que cerca a missão, mas os segredos dos próprios personagens que ajudam a impulsionar a trama. De fato, a maioria dos personagens não são exatamente quem dizem ser e logo fica claro que cada um recebeu suas próprias ordens e que estas devem ser cumpridas. Além do que, alguns tem agendas particulares que podem entrar em choque com os objetivos designados pelos seus superiores e custar muito caro. Bem vindo à paranoia!

Sem saber quem é amigo ou inimigo, os personagens terão de lidar com situações imprevisíveis enquanto seguem à caminho da Estação Motorizada, encontrando lá algo ainda mais aterrorizante e profundamente perturbador.

Não vou dar spoilers à respeito do cenário, mas posso assegurar que o reconhecimento de Machine Tractor como uma das melhores monografias, senão a melhor, é bem merecido. O cenário consegue equilibrar pesquisa histórica, terror e situações viscerais de uma forma muito eficiente. As cenas parecem ser costuradas com o intuito de tornar o jogo cada vez mais sufocante, realçando os elementos de isolamento e desesperança que permeiam a trama inteira. Eu gostei do trabalho de pesquisa, com o autor fornecendo informações úteis para direcionar o Guardião e dicas para situar os jogadores na trama. É claro, conhecer minimamente esse período histórico ajuda a criar uma atmosfera mais adequado para a sessão.

O único senão à respeito de Machine Tractor é que a criatura envolvida, responsável pelo horror sobrenatural, acaba sendo um tanto quando óbvia para jogadores veteranos. Não é preciso mais do que algumas descrições para que os jogadores mais tarimbados saibam o que terão de enfrentar (e o quanto estão ferrados!) logo de início. Não chega a ser uma falha, mas se os indícios fossem mais nebulosos, a aventura poderia render ainda mais .  


Ainda assim, Machine Tractor fornece uma trama diferente cujo maior atrativo é justamente fomentar o clima de desconfiança não apenas diante de criaturas ou de NPCs, mas entre os próprios jogadores. A medida que eles tentam cumprir suas ordens especiais, de preferência sem que os demais saibam, o nível de tensão segue crescendo até o momento em que o grupo terá de prestar tanta atenção nos colegas quanto nos horrores que os cercam.

Eu gostei muito dessa aventura, achei a premissa dela extremamente interessante, mas como é de hábito, fiz uma série de adendos e inseri uma trama paralela envolvendo uma nova ameaça além da que está presente no roteiro original. No fim, muita coisa acabou mudando.

Além das alterações na trama, incluí também alguns novos recursos e pistas para serem coletadas enquanto o grupo busca desvendar o mistério. Nas duas vezes que narrei o cenário, a primeira seguindo o roteiro original à risca e a segunda com as minhas mudanças, o resultado foi excelente. Modéstia à parte, as mudanças ajudaram a esconder um pouco melhor a identidade do monstro e criar um clima de suspense. Além disso, na segunda oportunidade, o cenário terminou com apenas um sobrevivente escapando de forma épica.

A seguir estão fotos do material de jogo que produzi para Machine Tractor Station Kharkov-37.  

MATERIAL DO CENÁRIO

Machine Tractor é um cenário investigativo bem interessante, ele possui um mistério central que exige dos jogadores certo grau de experiência. Eles vão precisar interrogar suspeitos e conversar com um bom número de testemunhas para saber o que está acontecendo. Em um ambiente de desconfiança, terão de alternar momentos em que precisam convencer e bajular, com outros que será necessário intimidar.

Além disso, há uma boa quantidade de pistas físicas para serem processadas e relacionadas com a história. Eu cheguei a criar algumas adicionais para a minha versão. 

Uma visão geral do material de jogo que inclui além dos Recursos, cartas, mapas, documentos, passaportes, registros e fotografias. O material é perfeito para a imersão dos jogadores.

Comprei a versão em PDF de Machine Tractor e mandei para a impressão. O suplemento não é grande, com algo em torno de 110 páginas. O miolo é preto e branco e com uma formatação que deixa um pouco a desejar. Eu soube que em 2008 foi produzida uma nova edição que corrigiu erros de digitação e clarificou alguns trechos confusos. Não tenho como avaliar como ficou pois só tenha a primeira versão, mas a revisão é muito bem vinda. 

Visualmente o livro recorre a fotografias e desenhos, sobretudo de cartazes de propaganda reais usados na URSS no período em que se passa a trama. Eu gostei desse estilo que confere ao material um ar documental, mas os poucos desenhos relativos à história em si são bem ruins, uma amostra de como a arte no material da Chaosium pré-7a edição era tosca.

Ao menos as fotografias são boas, assim como os desenhos de veículos e equipamentos à disposição dos personagens. Uma nova edição, adaptando o material para a atual edição poderia ser uma ótima pedida. 

FICHAS DE PERSONAGENS


Eu adaptei as fichas de personagens para a 7a edição e imprimi o material com essa fonte vermelha que me pareceu bem adequada.

Cada ficha acompanhava uma fotografia e o histórico, além de um cartão com o nome, a ocupação e o símbolo da divisão para a qual o personagem trabalhava, por exemplo, Exército Vermelho, TASS, Serviços Especiais etc.

Com nomes um tanto complicados e agendas particulares, achei que seria mais fácil para os jogadores poderem ler e entender quem é quem no grupo.


O grupo incluía alguns dos personagens prontos cujas fichas estão no final do livro, mas preferi adaptar algumas coisas e incluir mais alguns detalhes.

O grupo era composto dos seguintes personagens:

Capitão Grigori Fyodorov, veterano do Exército Vermelho e comandante da missão.
Sargento Nicholai Dugov, militar auxiliar e homem de confiança.
Comissário Pietr Ivanovich, Secretário de Ideologia do Partido.   
Especialista Técnico Yuri Kopolev, engenheiro e técnico em comunicações.
Oficial Médico Visarion Iurikov Liubimov, médico à serviço do Exército Vermelho.
Professor Yevgeny Vassilovich Ullonov, Cientista com formação em Física e Astronomia.


Inclui também uma medida do quão fiel e devotados os personagens são aos seus superiores e ao Estado Soviético. Isso ajuda a estabelecer quais deles estão mais propensos a se desviar de suas ordens e quais seguirão à risca as diretrizes que lhes foram traçadas.

ORDENS INDIVIDUAIS


Eu escrevi as ordens secretas e agendas particulares de cada personagem para que eles pudessem se guiara través delas no curso da aventura.

Coloquei as ordens dentro dos envelopes com o nome e símbolo de cada facção para a qual os personagens trabalham. Na minha opinião, esse foi o ponto alto da história, com os jogadores preocupados em cumprir as ordens à risca e outros tentando cobrir qualquer rastro de atividade ilícita. 


É claro, como manda a cartilha da paranoia, nem todos personagens eram quem diziam ser. Alguns estavam lá para observar e reportar, alguns para espionar e outros para cumprir ordens ainda mais drásticas sabendo de antão algumas informações sigilosas.

Entre os objetivos particulares, a missão colocava à prova as convicções de cada personagem, na medida que alguns deles podiam aproveitar os incidentes para garantir benefícios futuros ou ainda acertar velhas disputas de uma vez por todas.

O CÓDIGO SECRETO DA NKVD


Esse provavelmente foi meu recurso favorito no cenário. Com certeza, foi o que deu mais trabalho para fazer...

Ele simula um cartão de código usado pela NKVD para passar pistas e informações secretas aos seus agentes de campo.

O cartão postal com uma cena do Camarada Lenin discursando possui várias perfurações. Ao ser colocado sobre um mosaico de letras misturadas, ele revela uma mensagem secreta que apenas um agente da NKVD de posse do cartão seria capaz de decifrar.


Esse tipo de recurso interativo sempre é muito bacana nas aventuras, pois obriga o jogador a processar a pista. Se ele não encontrar ou for incapaz de decifrar simplesmente perde a pista e a solução do mistério pode acabar comprometido.

A CAIXA DE CIGARROS


Eu queria outro recurso interativo para a aventura e resolvi fazer essa caixa de cigarros soviéticos.

A ideia é que uma pista importante ficaria escondida dentro dela. Na época do jogo, comprei um maço e coloquei os cigarros dentro da caixa para disfarçar onde estaria a pista. 

Funcionou muito bem, levou algum tempo até o grupo encontrar a pista.


Eu encontrei o modelo da caixa na internet, imprimi e colei ela em cima de uma caixa de cigarros de verdade, tampando as propagandas modernas. Com o tempo, a cola ficou meio frouxa e ela está precisando de um conserto.

Se eu for narrar de novo esse cenário, vou providenciar uma reforma. 

OS MAPAS


Machine Tractor possui alguns mapas prontos dos assentamentos que o grupo explora e da Estação Kharkov. Eu não gostei muito dos mapas que acompanham o livro, são bem simplórios pra falar a verdade.

Fiz um mapa à mão, ficou um pouco melhor, mas ainda daria para fazer algo com acabamento mais cuidadoso. É outra coisa que vou precisar trabalhar se narrar esse cenário novamente. 

Já o mapa da União Soviética eu encontrei em um Atlas antigo. Fiz algumas marcações de onde se passa a história.

O PASSAPORTE SOVIÉTICO


O passaporte soviético de um dos NPCs era originalmente de outro cenário se passando na Guerra Civil Espanhola. Mas ele serviu como uma luva para Machine Tractor.

Eu precisava identificar um dos NPCs e os documentos dele ficariam bem mais interessantes emitidos dessa maneira do que através de um simples documento de identificação.

Ali atrás tem uns cartões postais com propaganda estatal da época.


O interior do passaporte identifica seu dono e posto no Partido Comunista Soviético. 

E sim, eu fiz uma pequena bandeira soviética para servir de prop na aventura.

HANDOUTS (RECURSOS DO GUARDIÃO)


A aventura em si tem uma boa quantidade de recursos para serem encontrados pelos jogadores como podemos ver nessa foto.

Eu complementei com mais alguns handouts adicionais e fotografias.


Esse é outro recurso que deu trabalho para fazer mas que teve um bom resultado. A carta foi escrita por alguém que logo em seguida meteu uma bala na própria cabeça, manchando o papel.

Procurei algumas palavras em russo e aproveitei para fazer um glossário com termos que poderiam ser empregados pelos jogadores. Na segunda vez que jogamos, eles entraram na brincadeira e foi um tal de Tovarish pra cá e pra lá.  

Bom é isso, 

Das vidaniya, camaradas!