quarta-feira, 28 de março de 2018

Cadáver andarilho - A estranha vida após a morte de Elmer McCurdy


O ano era 1911, o Oeste Selvagem já estava em seus suspiros finais, mas nem por isso era menos violento e estranho. Naqueles tempos, um certo bandido raia miúda chamado Elmer McCurdy teve uma ideia mirabolante. Ele pretendia assaltar um trem em plana viagem, a composição férrea passaria próximo da fronteira e ele conseguiria saltar e escapar para o México, driblando a jurisdição da lei. Uma vez ao Sul da Fronteira ele pensava em se aposentar, com direito a sombrero, tequila e señoritas.

Elmer planejou o assalto na companhia de três comparsas, mas no dia, dois deles supostamente embarcaram no trem errado. Quando Elmer anunciou o assalto ao vagão de passageiros, ele se viu sozinho sem cobertura em um lugar cheio de pessoas que por acaso também portavam armas. Ele ainda conseguiu escapar com um saco contendo 46 dólares e algumas garrafas de uísque que aproveitou para surrupiar no bar do trem. Mas a coisa ficou feia e ele teve de abrir caminho à bala.

O bandido desceu do trem antes do que esperava e teve que roubar um cavalo. Foi perseguido então pelo xerife, delegados, alguns passageiros enfezados e uma posse de vigilantes fortemente armados. Elmer ainda conseguiu escapar por alguns quilômetros mas acabou alcançado pelos seus perseguidores. Dizem as lendas que ele tentou se render, mas o grupo de vigilantes exercendo a lei do oeste não quis saber de rendição. Encheram o pobre Elmer de chumbo ali mesmo, com mãos para cima e tudo!

Esse provavelmente seria o fim da história, apenas mais um caso de violência e morte entre os vários envolvendo bandidos e justiceiros do Oeste, isso se não fossem algumas pequenas reviravoltas.


O corpo de Elmer foi levado para a cidade de Pawhuska, Oklahoma e entregue aos cuidados d eum agente funerário que embalsamou, tratou e limpou o cadáver acreditando que algum parente pagaria pelo serviço. Infelizmente, ele não tinha nenhum conhecido na região e o agente funerário se sentiu logrado. Para conseguir algum trocado ele decidiu vestir o cadáver com uma roupa de vaqueiro, colocar em sua cintura uma cartucheira com dois colts e deixar ele dentro de um caixão apoiado na parede. A seguir, o papa defuntos colocou uma placa identificando o morto como um dos maiores bandoleiros da região. As pessoas pagavam um níquel para dar uma olhada no bandido. Formavam-se filas e de vez em quando alguns voltavam para ver duas, três, dez vezes o morto famoso.

Certo dia um homem chamado Avery chegou à cidade e se disse ultrajado pelo tratamento que estavam dando ao pobre bandido. Quando perguntaram quem era o sujeito e o que ele tinha com isso, Avery respondeu que o defunto era seu meio irmão há muito desaparecido. Na época não havia como confirmar as coisas, e a palavra de um homem, mesmo a de um mentiroso, aproveitador e charlatão como aquele valia alguma coisa.

Acontece que o irmão não era irmão coisa nenhuma, seu nome verdadeiro era James Paterson e ele era o proprietário de um show itinerante chamado Great Patterson Carnival Show. Sabendo que as pessoas tinham um interesse mórbido em ver o cadáver e percebendo as implicações econômicas disso, ele planejou um esquema para reclamar o defunto e colocar ele entre as atrações de seu circo de pulgas. Apresentar foras da lei como um estranho tipo de troféu para os curiosos era o negócio perfeito, sobretudo porque o funcionário não falava, não ganhava salário e trabalhava a qualquer hora e todos os dias. Elmer, chamado então de "O criminoso que a lei não conseguiu capturar vivo" foi apresentado como uma das atrações até que Patterson decidiu vender seu negócio lá pelos idos de 1922.


O cadáver foi colocado em um depósito e ficou lá por um bom tempo até que alguém resolveu se livrar daquelas tranqueiras. Para conseguir um trocado, o dono do depósito vendeu o lote todo em um leilão para um tal Louis Sooney que tinha um "Museu do Crime" em que apresentava bonecos dos foras da lei mais conhecidos do oeste. No show estavam modelos em cera de Jesse James, Bill Doolin e outros criminosos famosos. Elmer foi acrescentado ao espetáculo como o "Fora da Lei de Oklahoma" e chegou a ser alugado em 1933 como figuração para o filme Narcotic! Na produção, que falava dos riscos do uso de drogas, o cadáver serviu de exemplo como o corpo de alguém que usou drogas durante parte de sua vida e por isso tinha a pele deteriorada. Na realidade o estado de conservação da múmia não era dos melhores depois de tantas peripécias e ele precisou até ser restaurado.

De uma forma ou de outra, em 1949 a múmia, que muitos tratavam a essa altura como um boneco acabou sendo vendida novamente, dessa vez para o Museu de Cera de Hollywood. O Museu costumava emprestar ou alugar seu acervo para o pessoal do cinema e nesse meio tempo Elmer conseguiu fazer uma ponta em pelo menos mais duas produções baratas e realizar algumas aparições na televisão. Em 1968 uma tempestade atingiu o depósito onde Elmer estava guardado e ele acabou sofrendo alguns danos. Um dos rapazes que fazia o inventário descobriu que a ponta das orelhas e do nariz dele haviam sido danificadas e ele constatou surpreso que do nariz se projetava um osso. Até então, o pessoal do depósito tratava a peça como um boneco de cera e descobrir que ele era um cadáver foi um tanto... desagradável.

A dona do depósito resolveu se livrar dele e ofereceu a uma série de pessoas, mas ninguém queria aquele negócio, ainda mais depois que ficava claro sua natureza. Além do mais, a exposição havia feito com que a múmia escurecesse e ganhasse um aspecto macabro. Para comprar aquilo, só mesmo alguém que não se importasse com coisas medonhas. E foi o que aconteceu! Em 1972,o dono de um Parque de Diversões em Long Beach bateu os olhos na Múmia e se apaixonou (ao menos platonicamente!)

A múmia foi arrematada por uma ninharia e levada para o "The Pike", um parque que tinha entre suas principais atrações um Trem Fantasma. Colocaram uma fantasia no pobre do Elmer, cobriram ele de teias de aranha de mentira, fuligem e pronto, ele estava preparado para seu próximo trabalho como morto vivo.


Elmer ficou ali fazendo seu bom trabalho até que o Parque foi contratado para servir de locação em um episódio da série televisiva "O Homem de Seis Milhões de Dólares" em 1976. Durante as filmagens um dos braços do "boneco"se soltou e quando foram prender ele no lugar descobriram ossos humanos.

A polícia foi chamada e o cadáver levado como evidência para ser analisado. os donos do Parque disseram que não sabiam detalhes a respeito e que haviam adquirido a peça como se fosse um boneco de cera. Um exame de raio X determinou que o "boneco" tinha ossos e órgãos que haviam sido recobertos com camadas e mais camadas de cera, serragem e preenchimento à base de enxofre. Dentro da boca dele encontraram além de lixo, uma moeda e tickets do Museu do Crime de Louis Sooney. Também descobriram ferimentos de tiro que foram preenchidos com serragem e as balas que mataram o pobre sujeito. Analisando a munição, a polícia conseguiu determinar que ele havia morrido no início do século.

O trabalho para determinar quem era o sujeito incluiu a remoção da arcada dentária e uma análise dos dentes. Enquanto isso, detetives buscaram informações a respeito da origem e seguiram passo a passo as indas e vindas do "boneco". A imprensa ficou sabendo do ocorrido e também ajudou nas investigações publicando a fotografia de Elmer. Logo, pessoas que haviam visto a figura em shows itinerantes a identificaram positivamente como Elmer McCurdy, que havia morrido em 1911 após um assalto mal sucedido.

Em abril de 1977, sua longa jornada chegou ao fim.

Morto a tiros pela Posse do Xerife nas Montanhas de Osage em 7 de outubro de 1911
Retornado a Guthrie, Oklahoma de Los Angeles para enterro em 22 de abrilde 1977
O cadáver foi levado para Guthridge, Oklahoma e enterrado em uma cerimônia com a presença de mais de 300 pessoas. Para evitar que ele fosse roubado novamente, ou quem sabe se erguesse para prosseguir em sua carreira no show-business, a sepultura foi coberta com uma camada de 60 centímetros de concreto. 

Até onde se sabe, ele finalmente descansou depois disso.

Apenas para constar, um último detalhe curioso. Enquanto Elmer esteve exposto no Parque de Diversões Pike, ele se tornou um dos "monstros" favoritos de muitas crianças. Afinal, diferente dos demais, ele incorporava perfeitamente o papel de morto vivo.

Uma das crianças que passeavam no brinquedo iria crescer e se tornar o designer de uma linha de brinquedos para a empresa Mattel. Anos mais tarde, quando ele recebeu instruções para criar o visual de uma nova linha de action figures, ele recorreu às suas lembranças de infância como inspiração para o principal vilão. Ele queria que o personagem fosse assustador e bizarro e nada se encaixava melhor nessa descrição do que o boneco que o assustava tanto quando criança. Foi assim que nasceu o visual do principal inimigo de He-Man, o Esqueleto na década de 80.

O pós-vida de Elmer McCurdy foi realmente muito incomum.

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